Desigualdades relacionadas à distribuição de água no NE

Escassez de água no semiárido nordestino tem histórico de promessas políticas não cumpridas (Imagem: Cáritas NE)

Indicadores do Observatório sobre este tema:
ind010309, ind010309RNE

Apesar de o Brasil ser um país privilegiado quanto ao volume de recursos hídricos e possuir cerca de 14% da água doce do mundo, a disponibilidade de água não é uniforme e a oferta de água tratada reflete contrastes no desenvolvimento e desigualdades sociais associadas. No Estado do Amazonas, por exemplo, a bacia Amazônica possui 73% de toda água doce disponível do país. No entanto, somente 5% da população total do país mora na região Norte e pode usufruir desse benefício.

Além da disponibilidade, a distribuição e a oferta de água tratada também representam obstáculos a serem vencidos. Na síntese de indicadores da PNAD 2009 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), o número de domicílios atendidos por rede geral de abastecimento de água no Brasil (49,5 milhões) representou 84,4% do total de domicílios. Foi observada uma tendência de crescimento ao longo dos anos anteriores, exceto na Região Nordeste, que apresentou um crescimento discreto na proporção de domicílios atendidos.

A causa da escassez de água no Nordeste reside, primeiramente, na baixa pluviosidade e irregularidade das chuvas da região, além de uma estrutura geológica que não permite acumular de maneira satisfatória água no subsolo, o que, de certa forma, interfere inclusive no volume de água dos rios. Contudo, para além de questões geográficas, sabe-se que a escassez de água no semiárido nordestino tem um histórico de promessas políticas não cumpridas e é um problema que necessita de resposta urgente e prioritária. Dentro desse contexto, há papéis diferentes a serem desempenhados pelas prefeituras, Estados, Governo Federal e pelos cidadãos.

Em entrevista recente, o secretário nacional de Defesa Civil Humberto Viana relatou que muitas vezes o problema reside na falta de informação segura sobre onde realmente falta água e informou que poderá ser preciso maior organização das prefeituras no momento de relatar a necessidade de ajuda. Segundo o secretário, apesar de ainda não ter um período específico para que o pacote de combate à estiagem seja implantado, é preciso reconhecer que esse é um problema antigo com poucas soluções concretas até o momento.

Ainda em 2013, o governo pretende aumentar em torno de 30% a quantidade de carros-pipa destinados a combater a estiagem no Nordeste brasileiro, passando dos atuais 4,9 mil para até 6 mil. Além disso, confirma a entrega de 130 mil cisternas até julho desse ano, que podem ajudar na produção (alimentação ou irrigação) de um ou mais produtores da região.

Segundo o indicador 010309 do nosso Observatório, a proporção da população servida por água no Brasil vem aumentando ao longo dos anos (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) /2001-2009). Além disso, em todos os anos analisados há um gradiente em relação à escolaridade e a proporção de população servida por água. Quanto maior a escolaridade, maior é essa proporção. Além disso, há uma variação de acordo com a região. No ano de 2009, por exemplo, a proporção de população servida por água na região Sudeste foi de 92%, enquanto na região Norte e Nordeste foram de 59% e 77%, respectivamente.

Entre os anos de 2001 a 2009, algumas regiões metropolitanas do Nordeste (Fortaleza, Salvador e Recife) apresentaram, segundo o indicador 10309RNE, avanços diferentes na proporção da população servida por água, além de um crescimento muito sutil dessas proporções. Em 2009, enquanto Salvador apresentou níveis quase universais de população servida por água (99%), Fortaleza apresentou uma proporção de 90% e Recife de 89%. Quase nenhuma desigualdade foi encontrada na cidade de Salvador em relação aos estratos de escolaridade e a proporção da população servida por água. O mesmo não ocorreu em Fortaleza, onde os mais escolarizados apresentam uma proporção aproximadamente 10% maior de população servida por água do que os menos escolarizados.

As condições de moradia apresentam uma relação forte com a escolaridade dos indivíduos. Além da rede de abastecimento de água, fatores como cobertura da rede de esgoto, número de janelas por cômodo e ambiente domiciliar se encontram diretamente relacionados com o estado de saúde e com a qualidade de vida dos indivíduos. O conceito contemporâneo do direito à saúde engloba a atenção à saúde e também temas relacionados, como acesso a água potável e saneamento básico. Sendo assim, como reduzir as iniquidades sociais para melhorar o abastecimento de água? Como acelerar o progresso rumo a alcançar a Meta de Desenvolvimento do Milênio referente ao acesso universal ao abastecimento de água?

 

São necessárias não apenas medidas de combate a estiagem, mas sim propostas que forneçam estrutura às pessoas para enfrentar a seca. O problema não é de falta de água, mas sim de distribuição, de vontade política e de recursos.  Uma política pública permanente de acesso à água de boa qualidade para o consumo humano, como o Programa Água Doce no Nordeste, por exemplo, que transforma a água salgada em potável, pode ajudar a população de baixa renda em comunidades difusas a se manter.

O Atlas Nordeste de Abastecimento Urbano de água, editado pela Agência Nacional de Águas (ANA), é outro exemplo de proposta que sugere o uso de cisternas rurais, barragens subterrâneas, barreiros, trincheiras, dentre outras soluções possíveis. No entanto, apesar dessas serem medidas práticas, devemos considerar que existem fatores que são as causas das causas, e devemos tê-los como alvo de ação. Não se pode perder de vista que alguns determinantes sociais, como a escolaridade e a renda, são capazes de produzir iniquidades sociais relacionadas ao abastecimento de água no Brasil, além de possuir potencial para interferir no planejamento e resultado de programas nessa área.

Referências Bibliográficas

Atlas Brasil de Abastecimento Urbano de Água [Internet]. Brasília (DF): ANA – Agência Nacional de Águas; 2010 [acesso em 22 maio 2013]. Disponível em: http://atlas.ana.gov.br/Atlas/forms/Home.aspx

Governo oferece mais água ao Nordeste e cobra organização de prefeituras [Internet]. Terra; 2013 Maio 14 [acesso em 22 maio 2013]. Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/governo-oferece-mais-agua-ao-nordeste-e-cobra-organizacao-de-prefeituras,228f95d82cd9e310VgnCLD2000000dc6eb0aRCRD.html

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos. Objetivos de desenvolvimento do milênio: relatório nacional de acompanhamento. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/Ministério do Planejamento; 2007 [acesso em 22 maio 2013].  Disponível em: http://www.pnud.org.br/Docs/3_RelatorioNacionalAcompanhamentoODM.pdf

Ind010309 – Proporção da população servida por água, por ano, segundo região e escolaridade [Internet]. Rio de Janeiro: Portal Determinantes Sociais da Saúde. Observatório sobre Iniquidades em Saúde. CEPI-DSS/ENSP/FIOCRUZ; 2012 Jan 30 [acesso em 22 maio 2013]. Disponível em: https://dssbr.ensp.fiocruz.br/wp-content/uploads/2012/03/Ind010309-20120130.pdf

Programa Água Doce [Internet]. Brasília (DF): Ministério do Meio Ambiente. [acesso em 22 maio 2013]. Disponível em: http://www.mma.gov.br/agua/agua-doce

Ind010309RNE – Proporção da população servida por água, por ano, segundo Brasil, Região Nordeste, regiões metropolitanas do Nordeste e escolaridade [Internet]. Rio de Janeiro: Portal Determinantes Sociais da Saúde. Observatório sobre Iniquidades em Saúde. CEPI-DSS/ENSP/FIOCRUZ; 2013 Abr 30 [acesso em 22 maio 2013]. Disponível em: https://dssbr.ensp.fiocruz.br/wp-content/uploads/2013/05/Ind010309RNE-20130430.pdf

 

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2 Comentário

  1. Olá, acho que devemos tomar na vida um caminho que não é de soberba mas de humildade e sabedoria, não fazer ” o que dá na lata “, e quanto as águas, pensar não só em termos geográficos mas econômicos financeiros saude educacionais,etc.

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