Indicador do Observatório sobre este tema:
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A saúde e a nutrição das crianças brasileiras vêm numa crescente melhora desde os anos 80. A primeira Meta do Milênio (redução pela metade do número de crianças subnutridas entre 1990 e 2015) já foi alcançada. A quarta Meta (redução de dois terços dos coeficientes de mortalidade de crianças menores de 5 anos) será alcançada provavelmente dentro de dois anos (Victora et al., 2011). Mas apesar dos expressivos avanços, pouco se sabe sobre o comportamento das desigualdades socioeconômicas, em nível individual, nos óbitos infantis. Qual a sua magnitude e como evoluem ao longo do tempo? Será realmente relevante medir e acompanhar essas desigualdades?
As taxas de mortalidade infantil (crianças menores de um ano) e na infância (crianças menores de cinco anos) são indicadores muito importantes, uma vez que têm um grande peso na expectativa de vida ao nascer. Ademais, esses indicadores têm sido historicamente utilizados para avaliar e comparar as condições de saúde e de vida de populações. As pesquisadoras Leila Garcia e Lúcia Santana, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), defendem afinadas que a medição das desigualdades em saúde é fundamental para o acompanhamento da situação de saúde da população. Sendo assim, conhecer a magnitude das desigualdades na mortalidade infantil e na infância, segundo a escolaridade materna e a renda domiciliar per capita, foi um passo fundamental dado por elas ao analisarem os microdados das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNAD) do período de 1993 a 2008.
No Brasil, a taxa de mortalidade infantil apresenta tendência decrescente: em 1980 era 78,5 óbitos por mil nascidos vivos e, em 2008, era estimada em 19,1 óbitos por mil nascidos vivos. Segundo a série especial Lancet Brasil, publicada em 2011, a taxa anual de decréscimo foi de 5,5% nas décadas de 1980 e 1990 e 4,4% no período 2000-08. Mesmo assim, há de se considerar que em países como Portugal, Suécia, Itália e Japão a taxa é de 3 óbitos por mil nascidos vivos. Outros países da América Latina, incluindo Argentina, Chile e Uruguai apresentam taxas de mortalidade infantil menores que a do Brasil, com 7, 11 e 14 óbitos por mil nascidos vivos, respectivamente. Vale ressaltar que a Meta do Milênio referente à taxa de mortalidade infantil é inferior a 15,7 óbitos por mil nascidos vivos, e inferior a 17,9 para mortalidade na infância.
Em 2007, as taxas de mortalidade infantil e na infância das regiões Sul (12,9 e 15,0 óbitos por mil nascidos vivos, respectivamente) e Sudeste (14,6 e 16,5 óbitos por mil nascidos vivos, respectivamente) já eram inferiores à Meta do Milênio, mas claramente refletem as desigualdades regionais que existem no país. Segundo Victora e colaboradores, em 1990 o coeficiente de mortalidade infantil (CMI) na região Nordeste foi 2,6 vezes maior que o da região Sul; em 2007, a razão entre os CMI do Nordeste e do Sul diminuiu para 2,2 vezes e a diferença dos coeficientes decresceu ainda mais rapidamente, de 47, em 1990, para 14 por mil nascidos vivos, em 2007. Vale salientar que desde 1990 a região Nordeste apresenta a maior redução anual da mortalidade infantil do país – 5,9% ao ano, em média. Diferenças acentuadas nos coeficientes são também observadas dentro das áreas urbanas, com taxas bem mais elevadas nas áreas mais pobres em comparação com as áreas mais ricas.
Com base na análise dos microdados da PNAD, pode-se verificar que apesar do aumento crescente no número de domicílios, entrevistas e nascimentos ao longo dos anos, em 2008 o número de óbitos em menores de um e de cinco anos foi reduzido consideravelmente. O que representa um grande progresso na saúde pública, especificamente na saúde materno-infantil. Contudo, existem fatores que devem ser mais bem compreendidos nessa análise, como o comportamento dos dados segundo a escolaridade materna e a renda domiciliar per capita. Para Leila Garcia e Lúcia Santana, as desigualdades na mortalidade infantil, segundo a escolaridade materna, se apresentaram em 1993, com uma forte concentração dos óbitos entre as mães que tinham baixa escolaridade. Já em 2008, houve uma distribuição mais homogênea dos óbitos de menores de um ano, segundo o número de anos de estudo da mãe. No que diz respeito à concentração dos óbitos de menores de cinco anos, no período de 1993 a 2008 houve redução significativa entre aqueles cujas mães tinham baixa escolaridade . Fato que representa também uma redução nas desigualdades sociais.
Considerando a renda domiciliar per capita, os microdados da PNAD apresentaram uma menor concentração dos óbitos ao final do período (2008), mas ao longo do tempo houve uma tendência de maior concentração dos óbitos infantis entre as crianças cujas mães tinham menor renda. A mortalidade na infância também apresentou grande variabilidade e comportamento semelhante à mortalidade infantil. Porém, ao final do período, os óbitos infantis apresentaram uma distribuição mais homogênea segundo a renda domiciliar per capita da mãe . Seguindo a mesma tendência da escolaridade.
Apesar da redução dos coeficientes de mortalidade infantil e da infância, e da tendência de homogeneidade segundo alguns determinantes sociais, o Brasil ainda apresenta coeficientes altos em relação de outros países, principalmente em relação às crianças menores de 5 anos (Victora et al., 2011). Além disso, existe a questão da desigualdade regional, pois os melhores resultados permanecem concentrados nas regiões mais ricas do país, e os óbitos infantis permaneceram desproporcionalmente concentrados nas regiões mais pobres. Para as pesquisadoras Leila Garcia e Lúcia Santana, isto nos fala sobre uma taxa de mortalidade infantil e na infância que ainda representa um desafio para pesquisadores, gestores e formuladores de políticas públicas, que devem se preocupar com o uso de um bom indicador em saúde que caminhe a par e passo com a redução das desigualdades e disparidades sociais.
Referências Bibliográficas
Garcia LP, Santana LR. Evolução das desigualdades socioeconômicas na mortalidade infantil no Brasil, 1993-2008. Ciên Saúde Colet [periódico na internet]. 2011 [acesso em 29 mar 2012];16(9):3717-28. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232011001000009&lng=en&nrm=iso&tlng=en
Victora CG, Aquino EM, do Carmo Leal M, Monteiro CA, Barros FC, Szwarcwald CL. Maternal and child health in Brazil: progress and challenges. Lancet [periódico na internet]. 2011 May 28[acesso em 29 mar 2012];377(9780):1863-76. Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0140673611601384
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