O ‘mundo ideal’ é aquele que o indivíduo mantém em nível elevado sua satisfação com a vida, tendo muitas experiências emocionais positivas e poucas negativas. No entanto, pouco se sabe sobre o processo que sustenta essa condição de bem-estar elevado, e isso ocorre, principalmente, devido a uma característica: a subjetividade. Cada sujeito possui um modo de ver o mundo com uma representação única e singular, isto é, embora as pessoas vivam em ambientes objetivamente definidos, o bem-estar individual diz respeito ao mundo subjetivamente percebido (Andrews & Withey, 1976).
O conceito de bem-estar subjetivo (BES), conforme descrito na literatura, engloba a satisfação com a vida e a felicidade, e representa um indicador de qualidade de vida que tem interessado cada vez mais os institutos de pesquisa e o mundo acadêmico. No entanto, apesar de uma crescente tendência da coleta de dados sobre bem-estar, a variação do método empregado para sua avaliação tem gerado resultados frágeis. Essa falta de consistência, além de restringir a comparabilidade entre os achados dos estudos, limita a qualidade das evidências que, por conseguinte, influencia negativamente a formulação e implementação de políticas sociais.
Em função desses aspectos e da eminente necessidade de padronização no campo metodológico, a Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD/UK) elaborou um manual com orientações sobre como medir o bem-estar subjetivo. A intenção primordial do grupo era que os políticos passassem a se concentrar não apenas no crescimento econômico e na melhoria dos padrões de vida baseados essencialmente nas condições materiais. A proposta considerou ampliar a visão para uma gama de ‘outras coisas’ que são importantes na vida das pessoas, como ter uma boa educação, viver em um meio ambiente de qualidade, ter uma moradia adequada, além da própria renda. Ou seja, que entendessem o quão complexo é a fórmula para uma vida melhor.
Apesar de esse manual ter sido publicado em 2013, o conceito de bem-estar subjetivo apareceu no final dos anos 1950, quando se buscavam indicadores de qualidade de vida para monitorar mudanças sociais e avaliar políticas sociais. A primeira revisão sobre bem-estar subjetivo foi realizada em 1967, e embora naquela época os dados sobre o assunto fossem limitados, concluiu-se que entre pessoas felizes estavam as que eram: jovens, com boa educação, bons salários, extrovertidas, otimistas, despreocupadas, religiosas, casadas, com autoestima elevada, com moral no trabalho, dentre outros atributos. Atualmente, mais do que atributos, o foco está na busca pela compreensão do processo que sustenta essa ‘tal felicidade e bem-estar’.
Segundo o manual, o conceito de bem-estar subjetivo engloba três componentes: a avaliação da vida, o afeto e a eudaimonia (tendência ou habilidade para se viver bem). O componente ‘avaliação da vida’ diz respeito a uma avaliação reflexiva sobre a “vida como um todo”, ou sobre algum aspecto mais específico como renda, saúde e trabalho. Resulta de um julgamento de valor por parte do indivíduo, em vez de uma descrição de um estado emocional. O componente ‘afeto’, termo usado na Psicologia para descrever os sentimentos particulares de uma pessoa ou estados emocionais em um determinado ponto no tempo, captura como as pessoas experimentam a vida: positiva (com sentimentos de felicidade, alegria e contentamento) ou negativamente (com sentimentos de tristeza, raiva, medo e ansiedade). O bem-estar eudaimonico, outro componente do conceito do bem-estar subjetivo, vai além da avaliação reflexiva do entrevistado e estados emocionais, compreende o bem-estar sob a perspectiva do funcionamento psicológico global, como competência, autonomia, significado e propósito.
Segundo Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento, o estudo do bem-estar subjetivo abrange diferentes conceitos e medidas, ou seja, diferentes medidas (de bem-estar) possuem diferentes finalidades. Por isso, é prudente considerar que não há uma resposta simples e direta sobre os determinantes do bem-estar subjetivo e, quando se trata de criação de políticas sociais, são necessárias orientações específicas para identificação das medidas certas. O manual proposto tem como objetivo central a melhoria da mensuração do bem-estar subjetivo, incluindo a validação, orientações sobre a padronização de conceitos, classificações e métodos que as agências nacionais de estatística podem usar, sendo possível a comparação entre os países.
Vale salientar que o conhecimento dos determinantes que sustentam o bem-estar não é o único componente para a formulação de políticas. Na verdade, é mais um item de grande relevância dentre muitos outros. Em outras palavras, uma avaliação de bem-estar mais elevada não significa que outras privações possam ser ignoradas. ‘Uma política não deve ser inteiramente voltada para o bem-estar, nem tampouco deve ser focada exclusivamente no lucro’, explica o grupoda OECD no manual.
A mensuração do bem-estar subjetivo, como proposto pela OECD, possibilita uma reflexão mais aprofundada sobre o uso de outras medidas nos estudos sobre os determinantes sociais da saúde e do bem-estar (além da renda, por exemplo, que é um indicador amplamente utilizado). A OECD reconhece que os resultados obtidos com medidas de bem-estar subjetivo têm problemas e críticas. No entanto, defende que mesmo sendo uma medida imperfeita, ela pode aferir de maneira mais abrangente o bem-estar dos indivíduos. Por exemplo, em relação a poder desfrutar de um parque público em boas condições ou de uma linha de trem mais rápida. Quando essas experiências se tornam mais palpáveis e consistentes, geram um impacto positivo e fortalecem as evidências para uma melhor política social, inclusive com efeito na saúde das populações.
Referências Bibliográficas
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Woyciekoski C, Stenert F, Hutz CS. Determinantes do Bem-Estar Subjetivo. Psico [periódico na internet]. 2012 [acesso em 15 set 2015];43(3): 280-288. Disponível em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistapsico/article/view/8263/8228
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Andrews FM, Withey SB. Social indicators of well-being: Americans’ perceptions of life quality. New York: Plenun Press; 1976.
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