Sistemas de Informações de Saúde no Brasil vem sendo incrementados: é fundamental articular informações de diversas fontes possíveis

Jacques Levin

Informações sobre iniquidades em saúde segundo estratificação social e suas tendências são fundamentais para a definição de políticas e análise de seu impacto. Apesar da cobertura e qualidade dos dados do DATASUS, as informações sobre iniqüidades de acordo com a estratificação social são relativamente precárias. Que estratégias ou iniciativas estão eventualmente em curso para melhorar essa situação?

Historicamente, os Sistemas de Informações de Saúde no Brasil foram criados para atender a demandas específicas.  Numa linha epidemiológica, foi desenvolvido, ainda na década de 70, o Sistema de Informações sobre Mortalidade. Já na linha de atenção à saúde, foi criado, no âmbito da Previdência Social, o Sistema de Informações Hospitalares, para pagamento dos serviços hospitalares efetuados a segurados. Com o tempo, outros sistemas foram sendo criados, seguindo mais ou menos esta compartimentalização: sistemas epidemiológicos (mortalidade, nascidos vivos, notificações de agravos) e sistemas de controle de programas de saúde (hospitalizações, atendimento ambulatorial, atenção básica, imunizações, controle de hipertensão e diabete etc.).

As informações em saúde, mesmo quando criadas para satisfazer a necessidades específicas, como as citadas, passaram a ser utilizadas para estudos sobre as condições de saúde dos brasileiros, notadamente em análises do perfil de mortalidade e morbidade. Neste processo evolutivo, os sistemas vêm sendo incrementados e aperfeiçoados para cada vez mais produzir informações de interesse para a saúde.

No entanto, ainda há muito a fazer. Para se estudar de fato a situação de saúde do povo brasileiro, é fundamental identificar os determinantes de saúde, articulando informações das diversas fontes possíveis, para relacionar dados de renda, instrução, habitação, saneamento etc. Alguns dos sistemas nacionais já levantam algumas destas informações, tais como escolaridade, cor/raça, ocupação e outros, mas havendo ainda muitos problemas de qualidade e completude destas informações, consideradas, geralmente, não essenciais para atender os objetivos principais dos respectivos sistemas.

De que maneira o Cartão Nacional de Saúde, conhecido como cartão SUS, poderá superar estas deficiências?

O processo em curso de implantação do Cartão Nacional de Saúde pode suprir várias das deficiências apontadas, ao permitir a identificação unívoca do cidadão, associando então as condições de vida aos serviços de saúde demandados. Este é, porém, um processo de médio a longo prazo e envolverá, certamente, questões éticas importantes no acesso às informações.

Esta estratégia cumpre um importante papel, porém deixa a descoberto uma importante área, a da demanda.  Para tal, pesquisas de base domiciliar têm sido fundamentais. Temos já, no Brasil, a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD) – Suplemento Saúde, que tem, quinquenalmente, obtido um grande volume de informações, principalmente sobre hábitos de saúde e acesso a serviços de saúde. Igualmente, o inquérito Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), apesar de limitado a capitais e domicílios com telefone fixo, tem trazido resultados importantes. Outros inquéritos, mais específicos, como a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS), a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) e outros, têm contribuído para ampliar a oferta de informações sobre o tema.

Em colaboração com o IBGE, o Ministério da Saúde está desenvolvendo a Pesquisa Nacional de Saúde, um inquérito de nível nacional, nos moldes da PNAD, mais aprofundado em diversas questões, como morbidade, acesso, demandas, fatores de risco e proteção etc. Este inquérito está previsto para ir a campo no próximo ano e espera-se que seus resultados ajudem a diminuir as lacunas existentes em diversas áreas, inclusive nos determinantes sociais de saúde.

Entrevista com:

2 Comentário

  1. Há de se criar então uma outra demanda específica: o monitoramento e avaliação das disparidades em saúde. A disparidade é o resultado iníquo, digamos assim, resultante de opressões estruturais (racismo, sexismo, homofobia, etc) a partir do recebimento do cuidado de saúde. A iniquidade está vinculada ao acesso (e por isso muita das vezes a culpa do não acesso fica para a vítima/cliente). Mas a disparidade em saúde carrega o peso da discriminação institucionalizada. Vide recente estudo do IPEA, divulgado na imprensa,sobre as disparidades raciais (e se não me engano de gênero) quanto aos transplantes.

  2. Parabéns pela entrevista. Mapear a situação atual é fundamental para estabelecer novos indicadores e utilizar os já existentes, de forma adequada às necessidades reais. Considero a Pesquisa uma excelente iniciativa!

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