10 anos do Suas: os desafios do sistema que organiza a assistência social em todo o País

A secretária Nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Ieda Castro, sabe bem o tamanho do desafio que o Sistema Único de Assistência Social (Suas) representa: um canal único para organizar serviços socioassistenciais em todo o País, que também faz a conexão com diversas outras áreas – entre elas a saúde – para acolher quem precisa. Estruturação de secretarias, melhoria de infraestrutura e aprimoramento dos trabalhadores estão entre os principais desafios do sistema, cuja implantação das bases consolidadas completa uma década este ano. No entanto, Ieda Castro assegura que há muito o que celebrar. Firmado sobre um modelo de gestão participativa, o conjunto de procedimentos chega hoje a mais de 10 mil unidades de atendimento e, somente no Nordeste, o número desses pontos com serviços cofinanciados pelo MDS cresceu 107% entre 2008 e 2014.

Quais seriam as principais conquistas do SUAS nesses 10 anos?

Nesses 10 anos, tivemos inúmeras conquistas. Estruturamos a rede e hoje podemos dizer que a Assistência Social está em todos os municípios brasileiros. Temos mais de 10 mil unidades públicas estatais com serviços cofinanciados pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Também aumentamos os recursos do financiamento e expandimos serviços e benefícios.

Conseguimos chegar às populações mais vulneráveis que permaneciam invisíveis, como a população em situação de rua, as pessoas com deficiência e as pessoas acolhidas nos serviços de acolhimento, também conhecidos como abrigos. Além de estruturarmos a gestão nos municípios e estados, também fortalecemos a participação social. Mas, nenhum desses avanços seria possível sem o comprometimento dos mais de 600 mil trabalhadores do SUAS, que levam esses direitos diretamente aos cidadãos.

De que forma o SUAS está conectado à qualidade da saúde das pessoas atendidas?

A gestão integrada e o acompanhamento familiar no Sistema Único de Assistência Social têm contribuído para o fortalecimento da intersetorialidade com outras políticas, como saúde, educação e trabalho e renda. Sempre que um cidadão é atendido pelo SUAS, são levantadas quais são suas necessidades. Isso proporciona um acompanhamento que visa a contribuir para a superação das necessidades identificadas, muitas vezes demandando ações intersetoriais. Uma das possíveis conexões é a articulação em rede, pois caso ele precise de cuidados de saúde, a equipe da Assistência Social o encaminhará à rede de saúde do município.

Outra conexão importante se dá por meio da transferência de renda garantida pelo Programa Bolsa Família, pois a assistência social acompanha as famílias em descumprimento das condicionalidades, entre elas as de saúde. O acompanhamento pelo SUAS contribui, ainda, para que as famílias voltem a acessar o seu direito à saúde. Há também uma Portaria Interministerial do MDS e do Ministério da Saúde que referencia o Serviço de Acolhimento em Residência Inclusiva para pessoa com deficiência aos Serviços de Saúde, garantindo ações de proteção articuladas entre as duas políticas. O Serviço de Abordagem Social também contribui com a qualidade da saúde, na medida em que identifica e se vinculas às pessoas em situação de rua, facilitando o acesso às demais políticas publicas.

Que avaliação a senhora faz da participação de estados e municípios no SUAS atualmente? Há alguma dificuldade para o desenvolvimento das ações em nível local?

O SUAS foi construído baseado na concepção da descentralização da participação e do controle social, por isso, sua base organizativa foi desenhada para que as transformações no Sistema dependessem da construção coletiva de gestores, entidades, trabalhadores e usuários da assistência social. Para tanto, foram criados espaços diversos de participação e deliberação. Logo, os avanços que foram alcançados, até o presente momento, refletem o grau de comprometimento dos entes na implementação dos serviços.

Os entes federados têm feito um grande esforço no sentido de aderir ao SUAS  e ofertar os serviços previstos na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais.  Este esforço pode ser observado quando observamos a expansão serviços estruturantes da política, a exemplo do PAIF (Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família), que já está presente em 99,6% dos municípios, e do SCFV (Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos), que está presente em 5.038 municípios. Os entes federados também têm se esforçado no sentido de elevar a qualidade dos serviços da assistência social.

Ainda temos alguns desafios, como a estruturação das Secretarias de Assistência Social, a definição de competências e processos de trabalho, a coordenação da política de recursos humanos e o acompanhamento e a supervisão da implementação da política nos âmbitos estadual e municipal.

Como a senhora avalia o Nordeste, especificamente, nesse contexto?

Nesses últimos 10 anos, o SUAS teve uma evolução importante na Região Nordeste. Entre 2008 e 2014, houve um crescimento de 107% das unidades público-estatais com serviços cofinanciados pelo MDS. O Nordeste é a região na qual todos os municípios têm Centros de Referência da Assistência Social (CRAS). Isso mostra o esforço e compromisso das gestões municipais e estaduais em relação ao SUAS.

Que Estados e/ou municípios se destacam na execução das políticas do SUAS atualmente?

O SUAS trabalha com a questão do território, ou seja, as vulnerabilidades e risco pessoal e social em uma dimensão territorial contribuem na definição, planejamento e execução dos serviços socioassistenciais. Cada região tem suas particularidades e suas demandas específicas. Temos municípios bem sucedidos, isto é, que desenvolvem os serviços e têm uma boa gestão da política de assistência social, em todas as regiões brasileiras.

Quais seriam hoje as ações (as que chegam aos usuários) dentro do SUAS que a senhora consideraria prioritárias?

As principais ações são aquelas desenvolvidas no âmbito do SUAS do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), o qual faz parte da Proteção Social Básica e desenvolve atividades de cunho preventivo. O SCFV está pautado na concepção de que a família e sociedade desempenham um papel importante na proteção de seus membros, e que, portanto, o Estado deve apoiar o fortalecimento destes vínculos socais. Este serviço ganha especial destaque no caso de crianças, adolescentes, jovens e idosos. Para estes públicos, o estabelecimento de níveis elevados de interação, resulta em elevação da sua qualidade de vida e prevenção de isolamento.

Há também o trabalho das equipes volantes que têm o objetivo de prestar serviços de assistência social a famílias que residem em locais de difícil acesso (áreas rurais, comunidades indígenas, quilombolas, calhas de rios, assentamentos, dentre outros). Essa equipe é responsável por fazer a busca ativa destas famílias, desenvolver os serviços socioassistenciais, além de apoiar a inclusão ou atualização cadastral das famílias no Cadastro Único, realizar encaminhamentos necessários para acesso à renda, para serviços da Assistência Social e de outras políticas.

Como se dá a avaliação de resultados dentro do sistema para além do Índice de Gestão Descentralizada, o IGD?

A Vigilância Social é uma das funções obrigatórias a serem exercidas pelos entes federados. Essa função está relacionada com o acompanhamento no território das demandas relacionadas aos serviços socioassistenciais, bem como com a qualidade da execução desses serviços. Neste sentido, cada ente federado, em seu nível de atuação, deve buscar realizar as ações necessárias para obtenção e o gerenciamento das informações relevantes quanto à demanda do território e à qualidade da oferta do serviço.

Com o objetivo de facilitar a gestão das informações pelos entes federados, o MDS disponibiliza Sistemas Nacionais de Informação para o registro e o acompanhamento da execução da política de assistência social. A partir destes sistemas, tais como o Censo Suas, o Registro Mensal de Atendimento (RMA) e o SUASWEB, os entes registram informações de oferta de serviços à população. O Governo Federal analisa essas informações a fim de estabelecer novos critérios de oferta de serviços e verificar a qualidade dos que estão sendo cofinanciados.  A análise das informações obtidas por meio dos sistemas próprios da assistência social é complementada com as informações disponibilizadas pelos institutos oficiais de pesquisa, como o IBGE, o IPEA e o Dieese e outros órgãos de reconhecida relevância quanto à realização de pesquisas sociais.

Além do acompanhamento da gestão, também é realizado o acompanhamento orçamentário dos recursos repassados aos entes federados. Um dos critérios utilizados para verificação da oferta do SUAS é a execução orçamentária. A análise da execução orçamentária dos entes passou a ser realizada a partir do ano de 2014 e foi regulamentada pela Portaria nº 36. A criação do mecanismo representa um avanço do ponto de vista do acompanhamento da qualificação da gestão, já que fortalece a estratégia da utilização de mecanismo para acompanhamento da eficiência do gasto.

Quais as perspectivas para o SUAS nos próximos anos? Quais desafios o MDS tem à frente?

Este é o momento de consolidarmos o SUAS, enfrentando os preconceitos e ganhando o apoio da sociedade, para que nos próximos anos possamos aprimorar a gestão e qualificar os nossos serviços. É preciso definir parâmetros de qualidade para o trabalho social; melhorar a infraestrutura dos nossos equipamentos; envolver a academia na construção de novos conhecimentos e no aprimoramento da formação dos trabalhadores; avançar nos mecanismos que assegurem o trabalho em rede e a intersetorialidade, inclusive com a elaboração de protocolos e fluxos de atendimento; e aperfeiçoar a relação com o sistema de Justiça e o Sistema de Garantia de Direitos.

 

 

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