Alcoolismo: quase metade dos nordestinos bebe com regularidade

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 76,3 milhões de pessoas sofrem de algum tipo de enfermidade relacionada ao uso do álcool no mundo. No Brasil, segundo o II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), realizado em 2012 pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas (Inpad), 6,8% da população é dependente da droga, o que equivale a cerca de 11,7 milhões de brasileiros.  No Nordeste, 48% das pessoas afirmam beber com regularidade.

Segundo a pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), realizada pelo Ministério da Saúde em 2012, Salvador é a cidade do país com maior número de pessoas que afirmam ter consumido quatro ou mais doses de bebida alcoólica num período de 30 dias. São 26,6% dos entrevistados. O ranking nordestino de consumo de álcool segue com Teresina (PI), 21,6%, Recife (PE), 21% e Fortaleza (CE), 16,3%.

Culturalmente aceito e até mesmo incentivado, o uso do álcool desencadeia diferentes problemas sociais e de saúde. Além das enfermidades relacionadas ao consumo abusivo da droga, ele ainda é associado a diferentes problemas de saúde, mentais e sociais, como depressão, violência e acidentes de trânsito. Mas o enfrentamento do alcoolismo como doença encontra barreiras no preconceito e no despreparo do Sistema Único de Saúde (SUS) para ser devidamente superado.

A professora da UFRPE e doutora em Neuropsiquiatria e em Ciências do Comportamento Reginete Cavalcanti estuda as características clínicas da associação entre depressão e dependência de álcool. Para ela, o uso abusivo da droga é um problema de saúde pública no país e precisa ser enfrentado como tal. “O alcoolismo é uma doença crônica que anda ao lado de um desejo incontrolável de beber. Com o tempo, o indivíduo passa a consumir maiores quantidades de álcool para obter os mesmos efeitos. As consequências nocivas desta dependência química vão desde sérios problemas sociais e familiares até graves complicações de saúde”, explica.

De acordo com a OMS, cerca de dois bilhões de pessoas consomem bebidas alcoólicas – 40% da população mundial acima de 15 anos de idade – e, a cada ano, cerca de dois milhões de pessoas morrem em decorrência de consequências negativas desse uso. Reginete afirma que não há uma relação comprovada entre alcoolismo e as condições socioeconômicas dos indivíduos e que não é possível afirmar que a dependência química da droga seja mais frequente em populações desassistidas. “No entanto, um estudo da UNIFESP de 2013 mostrou que o consumo cresce mais entre  os brasileiros de menor renda”, ressalta.

Ainda sem essa relação cientificamente estabelecida, de maneira geral, os serviços de saúde ainda são mais acessíveis para indivíduos com maior renda e escolaridade e, portanto, o combate ao alcoolismo enquanto doença não se afasta deste panorama de assistência à saúde no Brasil. Se, para as populações com melhores condições e qualidade de vida a doença ainda é um problema, para a saúde pública é um desafio trazer esta responsabilidade para si e enfrentá-lo como uma enfermidade como qualquer outra.

Presente em 180 países, os Alcoólicos Anônimos são a iniciativa mais conhecida no tratamento da doença. Eles defendem que, mesmo quando o abuso da bebida se torna um problema familiar, profissional e social, ainda é necessário que o paciente decida pelo tratamento. A psicoterapia (familiar, em grupo ou individual) ainda é a forma mais utilizada. O AA usa o método dos 12 passos e os veteranos dividem suas experiências como forma de contribuir para o tratamento dos pacientes ‘recém-chegados’. O sucesso do programa é atribuído à relação entre dependentes e pacientes em tratamento.

Para contribuir com a abrangência da assistência no Brasil, a Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad) cadastra Centros de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPSad) dos municípios, além de clínicas particulares, hospitais, universidades, comunidades terapêuticas e grupos de autoajuda para facilitar o acesso à assistência. Entidades cadastradas podem ser conferidas na página do Senad.

Para a pesquisadora Reginete Cavalcanti ainda é do sistema público de saúde que deve vir as maiores energias para o enfrentamento à doença. “O SUS não tem um atendimento adequado para o uso nocivo do álcool e outras drogas nem no Nordeste e nem em outras regiões do Brasil. Esse   atendimento  ainda tem muito a fazer para os brasileiros que precisam. Não há outro caminho a não ser investir em saúde e tratar o alcoolismo como uma  doença tão prejudicial como outra qualquer.  É preciso investir em políticas públicas”, comenta.

Referências Bibliográficas

Alcoolismo: instituições de prevenção, tratamento e redução de danos ajudam a afastar o vício. Brasília (DF): Portal Brasil; 2012 Abr 17 [acesso em 09 jun 2014]. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/saude/2012/04/alcoolismo

Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2012: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília (DF): Ministério da Sáude; 2013. [acesso em 17 jun 2014]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2012_vigilancia_risco.pdf 

Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas. II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas. São Paulo; 2012. [acesso em 07 de jun 2014]. Disponível em: https://inpad.org.br/wp-content/uploads/2014/03/Lenad-II-Relat%C3%B3rio.pdf

Entrevista com:

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*