Pesquisa associa Programa Bolsa Família à redução de nascimentos extremamente prematuros

Relacionados à pobreza e à baixa qualidade da atenção pré-natal, os nascimentos prematuros e suas complicações são a principal causa de morte entre crianças menores de 5 anos. Um estudo realizado por uma equipe de pesquisa do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia) avaliou a relação entre o recebimento do Programa Bolsa Família (PBF) durante a gestação e a ocorrência de nascimentos prematuros com menos de 37 semanas. Entre um dos principais resultados está a associação entre mães beneficiárias do programa e a redução de casos de bebês extremamente prematuros, nascidos com menos de 28 semanas. 

Foram analisados dados de pouco mais de 1 milhão de crianças (1.031.053) a partir da Coorte de 100 Milhões de Brasileiros, ferramenta construída pelo Cidacs/Fiocruz Bahia com base em informações do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), no período de 2004 a 2015. Estes dados foram vinculados às informações a folha de pagamentos do Bolsa Família, para identificar as gestantes beneficiárias; e a dados do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC, 2012-2015).  

Entre os dados das crianças analisados, quase 2/3 (65,9%) delas tiveram mães que receberam o Bolsa Família durante a gravidez e foram comparadas com gestantes que não foram beneficiárias do Programa. A equipe de pesquisa também explorou a classificação de acordo com gravidade da criança prematura: prematuros moderados a tardios (32 a < 37 semanas), severos (28 a <32 semanas) e extremos (< 28 semanas). Prematuros extremos foi o grupo que teve a maior associação com o recebimento do Bolsa Família, segundo o estudo. 

Diversas são as explicações da equipe de pesquisa para este resultado. Segundo o grupo, espera-se que o benefício do Bolsa Família recebido por gestantes tenha contribuído para a redução de nascimentos extremamente prematuros porque permitiu o aumento da renda das famílias das gestantes, diminuiu o efeito de eventos estressantes e porque pode melhorar a nutrição materna. Além disso, o cumprimento da condicionalidade de saúde do programa, que determina que as gestantes acessem serviços de saúde e sejam monitoradas e tratadas antecipadamente em possíveis comorbidades, também contribuem para este resultado. 

“Nascidos prematuros podem ter consequências ao longo da vida, incluindo déficits neurológicos e cognitivos, problemas de visão e audição e aumento no risco de doenças crônicas na vida adulta, resultando em custos elevados para os sistemas de saúde”, explica Naiá Ortelan, epidemiologista e pesquisadora associada ao Cidacs.  

Ainda segundo ela, iniciativas de redistribuição de renda para gestantes de baixa renda, como o Bolsa Família, são estratégias importantes para a proteção social e para a redução da mortalidade infantil em menores de cinco anos. “Nascidos prematuros tem maior predisposição a doenças crônicas na infância e vida adulta, resultando em custos elevados para os sistemas de saúde”, explica Naiá. 

Influência da qualidade da gestão do benefício 

Outro importante resultado da pesquisa foi uma redução de nascimentos extremamente prematuros entre as gestantes beneficiárias que realizaram um acompanhamento pré-natal adequado e que moravam em municípios com melhor gestão do Programa Bolsa Família, segundo o Índice de Gestão Descentralizada (IDG). 

O IGD é um indicador administrativo que mede a qualidade da gestão do Programa Bolsa Família e do CadÚnico no nível municipal. Os municípios recebem recurso financeiro do governo federal para pagamento de um valor por família registrada, ponderado pelo indicador de qualidade. O cálculo do IGD é composto pela taxa de atualização cadastral das famílias e taxas de acompanhamento das condicionalidades de saúde, educação e apoio ao controle social dos beneficiários do programa; pela adesão ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS); pela prestação de contas; e pelo parecer das contas do uso dos recursos. 

“Encontramos evidências de que as gestantes beneficiárias, mesmo morando em municípios com baixa qualidade de gestão do Programa Bolsa Família, foram associadas à menor ocorrência de nascimentos extremamente prematuros em comparação às não-beneficiárias”, declara Naiá, que complementa: “a associação encontrada foi ainda mais forte para as beneficiárias que moravam em municípios com melhor gestão do programa”. 

Reflexões acerca da importância desse estudo 

“Destacamos a importância fundamental não só da presença, mas também da qualidade das políticas sociais que vislumbram o alívio da pobreza quando visam a promoção da saúde entre populações vulneráveis”, ressalta a epidemiologista. Municípios que administram melhor as condicionalidades do Programa Bolsa Família, segundo o IDG, e oferecem serviços de saúde bem organizados para uma atenção adequada a gestações de alto risco têm o potencial de prevenir óbitos e complicações que podem decorrer do nascimento prematuro. 

A equipe de pesquisa ainda destaca que o estudo legitima que as políticas de saúde pública e inclusão social não são apenas ferramentas essenciais para melhorar o bem-estar de famílias pobres, mas também componentes essenciais para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Nesse sentido, considerar a subdivisão da prematuridade contribui para a formulação de diretrizes de políticas de saúde mais eficazes”, conclui Naiá. 

Colaborações 

Esse estudo envolveu a colaboração de pesquisadores (as) do Cidacs/Fiocruz Bahia; da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP); do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da Universidade Federal da Bahia (IME/UFBA); da Escola de Nutrição da UFBA; do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da UFBA; e da Faculdade de Epidemiologia e Saúde da População, da London School of Hygiene and Tropical Medicine (LSHTM). 

Título: Evaluating the relationship between conditional cash transfer programme on preterm births: a retrospective longitudinal study using the 100 million Brazilian cohort 

Pesquisador(es): Naiá OrtelanMarcia Furquim de AlmeidaElzo JúniorNívea Bispo da SilvaRosemeire Leovigildo FiacconeIla Rocha FalcãoAline RochaDandara RamosEnny PaixãoRita de Cássia Ribeiro SilvaLaura RodriguesMauricio BarretoMaria Yury Ichihara.

Periódico: BMC Public Health

Ano de publicação: 2024

DOI: doi.org/10.1186/s12889-024-18152-2

 

Por Cidacs/Fiocruz Bahia

 

 

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