Declaração Política do Rio sobre Determinantes Sociais da Saúde: 10 anos de implementação

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Determinantes Sociais da Saúde – Celebração do 10⁰ aniversário da Declaração Política do Rio

21 de Outubro | 10h-12h – transmissão pelo canal YouTube da VideoSaúdehttps://www.youtube.com/watch?v=5jm_irgWV_w

Neste outubro de 2021, completam-se dez anos da realização da Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde, promovida pela Organização Mundial da Saúde, (OMS), que reuniu na cidade do Rio de Janeiro, autoridades e delegados de 120 países e mais de mil participantes, também transmitida online em quatro idiomas. A Fundação Oswaldo Cruz foi a âncora do evento no Brasil.

Um dos resultados da Conferência foi a Declaração Política do Rio sobre Determinantes Sociais da Saúde, que sintetiza os compromissos dos chefes de Estado, ministros da Saúde e outros representantes de governos para articular essa temática com a agenda do desenvolvimento sustentável.

Transcorridos dez anos desses históricos evento e documento, a pandemia escancarou as imensas desigualdades vigentes no campo da saúde, com casos, mortes e sequelas afetando de maneira avassaladora os mais pobres e os mais vulneráveis das nossas sociedades: mulheres, crianças, idosos, indígenas, afrodescendentes e migrantes internos e externos.

Continuam atuais e clamam por transformarem-se em ações concretas os cinco princípios basilares para enfrentar as desigualdades em saúde, impingidas pelos determinantes sociais, econômicos, políticos, ambientais e sanitários negativos para a saúde: (i) adotar uma melhor governança no campo da saúde e do desenvolvimento; (ii) promover a participação social na formulação e implementação de políticas; (iii) continuar reorientando o setor da saúde para a redução das iniquidades no acesso aos serviços de saúde; (iv) fortalecer a governança e a colaboração global; e (v) monitorar os avanços e ampliar a prestação de contas.

Com foco na equidade em saúde, a Declaração destaca a estratégia Saúde em Todas as Políticas, disseminada pela OMS a partir de 2013, como enfoque promissor para ampliar a responsabilização de todos os setores governamentais e da sociedade com a saúde, na construção de uma governança promotora de sociedades mais inclusivas e produtivas.

Não foi por acaso que a Conferência Mundial se realizou no Brasil. A América Latina acumulou nos últimos sessenta anos importante produção de conhecimentos sobre as relações entre saúde, economia, Estado, sociedade e cultura, nos campos de ensino e pesquisa da saúde coletiva, medicina social e saúde pública, que informou estudos de epidemiologia, planejamento e ciências sociais em saúde. A vasta produção latino-americana evidenciou, por meio de abordagens abrangentes e plurais que articulam as ciências da saúde com as ciências sociais e humanas, que os fenômenos saúde-doença, além de produzidos biologicamente, são processos socialmente determinados.

Continuam atuais e clamam por transformarem-se em ações concretas os cinco princípios basilares para enfrentar as desigualdades em saúde, impingidas pelos determinantes sociais, econômicos, políticos, ambientais e sanitários negativos para a saúde

O Brasil, protagonista nesse contexto, respondeu rapidamente à introdução da temática dos DSS na agenda da OMS, que criara no início do século XXI, uma Comissão Global sobre DSS, constituindo, em 2006, a própria Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde. Em seu Relatório Final As causas sociais das iniquidades em saúde no Brasil (2008), a comissão apresentou recomendações para a incorporação da temática às políticas públicas e para a coordenação institucional de ações baseadas na intersetorialidade, na participação social e em evidências científicas.

Como um dos desdobramentos da Comissão, o país conta, desde 2009, com o Centro de Estudos, Políticas e Informação sobre Determinantes Sociais da Saúde na Ensp/Fiocruz (Cepi), que vem realizando, ao longo da década, atividades no Brasil e na América Latina, mais recentemente, com ações articuladas à Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030.

Em escala regional, o Cepi e o Cris/Fiocruz – este também na qualidade de Centro Colaborador da OMS/OPS em Saúde Global e Diplomacia da Saúde – têm colocado foco nas iniquidades em saúde no país e na América Latina, especialmente, em iniciativas com a Colômbia, México, Chile e Equador. Nesse âmbito, destaca-se a participação do Centro na coordenação de programas de capacitação de multiplicadores da abordagem Saúde em todas as políticas na América Latina, promovidos e patrocinados pela Opas, em conjunto com Chile e México, disseminada pela OMS desde 2013, a partir da Conferência Mundial sobre Promoção da Saúde, realizada em Helsinque.

No que se refere à gestão das políticas públicas, desde 2006, a combinação das perspectivas latino-americana/brasileira e a da OMS dos determinantes sociais da saúde e da equidade em saúde, informa os Planos Nacionais de Saúde e as diretrizes para elaboração dos Planos Estaduais e Municipais; a Política Nacional de Promoção da Saúde; diretrizes do Conselho Nacional de Saúde e da Conferência Nacional de Saúde; Políticas de Promoção de Equidade em Saúde; e, mais recentemente, a definição de competências da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, criada em 2019 na estrutura do Ministério da Saúde.

A pandemia da Covid-19 vem incorporando de forma inédita a temática dos DSS aos discursos oficiais governamentais, sobretudo das autoridades públicas setoriais, e às narrativas dos grandes veículos de comunicação

A partir de 2011, tendo como referência a Declaração Política do Rio, o Brasil adotou como estratégia para a disseminação e atualização da temática dos DSS no país a organização de Conferências Regionais sobre DSS nas macrorregiões brasileiras, mobilizando a comunidade científica, representantes das esferas de governo e sociedade civil para discutir a situação de saúde, as políticas em curso e os principais problemas socioeconômicos com impacto na saúde em âmbito regional. A primeira conferência regional foi realizada na Região Nordeste em 2013 e, entre 2015 e 2020, o projeto Desenvolvimento e Governança Territorial da Saúde, a partir de uma abordagem territorial aos DSS implementada na Região Norte, reuniu insumos para a preparação e organização da próxima conferência regional, a se realizar nesta região, oportunamente.

A pandemia da Covid-19 vem incorporando de forma inédita a temática dos DSS aos discursos oficiais governamentais, sobretudo das autoridades públicas setoriais, e às narrativas dos grandes veículos de comunicação. A força das evidências de como sua emergência e disseminação decorrem de mudanças nas mais várias dimensões da vida em sociedade, ocorridas na transição do século XX para o XXI, abarcando desde os impactos dos efeitos nocivos de modelos de desenvolvimento econômico sobre a biodiversidade de ecossistemas até as novas dinâmicas territoriais e sociais produzidas pela globalização econômica e pelas tecnologias da informação, tornou inadiável o reconhecimento dessa temática. Sobretudo, porque lança luz sobre os desfechos diferentes, desiguais, da doença, dependendo do lugar e/ou da posição do indivíduo na hierarquia social. Impactos que revelam graves injustiças decorrentes de decisões políticas não inclusivas, que deixam para trás importantes parcelas da população no acesso aos bens, serviços e tecnologias disponíveis. Situação agravada neste contexto em que o fenômeno da infodemia e sua vertente nociva, as fake news, trazem novos e impensados riscos para a saúde pública e para as decisões individuais sobre a saúde.

Em maio de 2021, depois de um período de latência, e em razão da alta relevância dos DSS demonstrada durante a crise sanitária da pandemia, a 74ª Assembleia Mundial de Saúde adotou a Resolução WHA74.16, que pede ao diretor-geral da OMS que prepare – baseando-se no informe da Comissão sobre Determinantes Sociais da Saúde da OMS de 2008, e seu trabalho posterior – um informe atualizado baseado em provas científicas, conhecimentos e melhores práticas sobre os determinantes sociais da saúde, suas consequências na saúde e na equidade sanitária, os progressos realizados e as recomendações sobre medidas futuras, para apresentação à 76ª Assembleia Mundial da Saúde que se celebrará em 2023.

Considerando a trajetória recente da temática dos DSS no Brasil, o momento de celebração dos dez anos da Declaração Política do Rio constitui uma excelente oportunidade para se avaliarem os resultados da institucionalização dessa temática no setor saúde sobre a gestão das políticas públicas do conjunto do governo e sobre a compreensão da produção social da saúde e da doença e dos novos riscos emergentes no século XXI.

Para dia 21 de outubro de 2021, diversas comemorações aos dez anos da Conferência e da Declaração do Rio estão sendo programadas, incluindo um webinar global da OMS e um webinar regional da América Latina, nos quais atores relevantes estarão refletindo sobre o significado dos eventos ao longo dos últimos dez anos e buscando identificar os desafios colocados pelos determinantes sociais da equidade em saúde.

* Paulo Buss é diretor do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fiocruz (Cris/Fiocruz); Patrícia Ribeiro é diretora do Centro de Estudos, Políticas e Informação sobre Determinantes Sociais da Saúde na Ensp/Fiocruz (Cepi); Luiz Augusto Galvão é pesquisador sênior do Cris/Fiocruz.

Por Paulo M. Buss, Patrícia Ribeiro e Luiz Augusto Galvão – Centro de Estudos Estratégicos Fiocruz . 19/10/2021

 

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