A produção de defensivos agrícolas cresce em todo o mundo em grandes proporções. Nos últimos 10 anos o mercado mundial de agrotóxicos cresceu 93%. Especificamente no Brasil os dados são alarmantes: o crescimento foi de 190% e em 2008, o país tornou-se o maior consumidor mundial de agrotóxicos, ultrapassando os Estados Unidos. Segundo um dossiê divulgado em maio pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) a utilização de agrotóxicos nas lavouras do país saltou de 599,5 milhões de litros no ano de 2002 para 852,8 milhões de litros em 2011. O documento está sendo lançado em três partes.
O texto do dossiê mostra que o consumo médio dos compostos químicos passou de 10,5 litros por hectare em 2002, para 12,01 por hectare em 2011 (Figura 01). Destaca ainda que o aumento do consumo está relacionado à diminuição dos preços e da isenção dos impostos sobre tais produtos, o que faz com que os agricultores utilizem maior quantidade por hectare.
De acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2010 o Brasil movimentou 19% da produção mundial destes agroquímicos. Para debater o uso dos produtos em plantações brasileiras, o Senado Federal promoveu em maio uma audiência pública sobre o mercado de agrotóxicos na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. A comissão levou os debates para o terreno da Saúde Pública, trazendo o alerta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre a utilização destes agentes químicos sem controle e para os danos causados à saúde através de seu consumo. “Nós não temos posição ideológica contra agrotóxicos, nós temos é que ter cuidado com a forma de produção, com a comercialização, com a prescrição e, principalmente, com a aplicação”, destacou José Agenor Álvares da Silva, diretor da Anvisa.
O Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos de Alimentos (PARA) da Anvisa realizou coleta de amostras em 2010 monitorando dezoito alimentos: abacaxi, alface, arroz, batata, beterraba, cenoura, pimentão, cebola, couve, feijão, laranja, mamão, manga, maçã, morango, pepino, tomate e repolho em 25 estados da federação, no caso, apenas São Paulo ficou fora da análise por ter uma pesquisa própria no estado. O estudo constatou que das 2.488 amostras coletadas 28% apresentavam resultados insatisfatórios. Isto pode estar relacionado tanto à aplicação de agrotóxicos na plantação, quanto por plantio em solo contaminado em colheita anterior.
O risco no Brasil pode ser observado mesmo nas pequenas lavouras. Um estudo realizado pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP, com agricultores no município de Bom Repouso (MG), onde 50% da população reside em áreas rurais, revelou que, a maior parte dos pequenos produtores que fazem uso dos defensivos agrícolas na região estão cientes dos riscos trazidos por eles. O município tem entre seus principais produtos cultivados a batata e o morango, considerado um dos vilões na lista de produtos onde podem ser encontradas maiores concentrações de agrotóxicos. Ainda de acordo com a pesquisa grande parte dos entrevistados revelou não conseguir entender as orientações do fabricante na bula do produto principalmente por conta de sua baixa escolaridade. Também foi citada a dificuldade na compreensão de termos técnicos.
Possível indicador dos riscos aos quais estão expostos os trabalhadores o fator escolaridade foi verificado no Censo Agropecuário do IBGE de 2006 (Gráfico 7), que analisou práticas agrícolas no Brasil, manejo e conservação do solo e o uso de agrotóxicos. Segundo dados obtidos com a pesquisa mais da metade dos estabelecimentos onde houve utilização de agrotóxicos não recebeu orientação técnica (785 mil ou 56,3%). O Censo aponta que 15,7% dos produtores responsáveis por aplicação de agrotóxicos não sabiam ler e escrever, fator que dificultava o acesso à informação correta sobre os agentes químicos. De modo geral, a pesquisa mostrou que o nível de escolaridade dos agricultores é baixo: entre as mulheres, o analfabetismo chega a 45,7%, enquanto entre os homens, essa taxa é de 38,1%. Os índices em outros níveis de ensino são: 8% para ensino fundamental completo, 7% para técnico agrícola ou nível médio completo, e apenas 3% com nível superior.
O relatório final do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos de Alimentos (PARA) destaca a necessidade da difusão e multiplicação da informação e da formação de agricultores com boas práticas agrícolas, bem como a fiscalização nos pontos de venda , na manipulação e produção dos alimentos. A Anvisa está reavaliando a autorização para uso de alguns compostos químicos utilizados em plantações em função dos danos à saúde decorrentes da exposição dietética e ocupacional.
Referências Bibliográficas
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ANVISA-Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA): Relatório de Atividades de 2010. Brasília; 2011 [acesso em 06 jul 2012]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/b380fe004965d38ab6abf74ed75891ae/Relat%C3%B3rio+PARA+2010+-+Vers%C3%A3o+Final.pdf?MOD=AJPERES
Carneiro FF, Pignati W, Rigotto RM, Augusto LGS, Rizollo A, Muller NM, Alexandre VP, Friedrich K, Mello MSC. Dossiê ABRASCO – Um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Rio de Janeiro: ABRASCO; 2012 [acesso em 06 jul 2012]. Disponível em: http://www.abrasco.org.br/UserFiles/File/ABRASCODIVULGA/2012/DossieAGT.pdf
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Impacto de agrotóxicos na saúde é tema de debate na Câmara [Internet]. Brasília (DF): ANVISA; 2012 Maio 10 [acesso em 06 jul 2012]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/anvisa+portal/anvisa/sala+de+imprensa/menu+-+noticias+anos/2012+noticias/impacto+de+agrotoxicos+na+saude+e+tema+de+debate+na+camara
Soares N. Pequenos produtores estão cientes de riscos dos agrotóxicos [Internet]. São Paulo: Agências USP de Notícias; 2012 Fev 16 [acesso em 06 jul 2012]. Disponível em: https://www5.usp.br/noticias/meio-ambiente/pequenos-produtores-estao-cientes-de-riscos-dos-agrotoxicos-aponta-pesquisa-da-eesc/#:~:text=Pequenos%20produtores%20est%C3%A3o%20cientes%20de%20riscos%20dos%20agrot%C3%B3xicos%2C%20aponta%20pesquisa%20da%20EESC,-17%2Ffevereiro%2F2012&text=A%20maior%20parte%20dos%20pequenos,o%20perigo%20que%20eles%20representam.
Entrevista com:
A matéria é importante e clama por melhor difusão de informação sobre o cultivo orgânico. Estamos falando muito do agratóxico e não estamos divulgando os benefícios dos orgânicos para alimentação e para a vivência no meio rural. Presenciei uma experiência em Assaré-CE e vi os benefícios do cultivo. Isso integra a sociedade e dá mais dignidade para as comunidades rurais. Agora, é importante que os governos locais façam articulação do processo entre as comunidades rurais. Eles sabem fazer, precisam apenas de uma liderança.