Indicador do Observatório sobre este tema:
ind010302
A obesidade tem sido considerada uma epidemia global. Entre 1980 e 2008, a sua prevalência mundial quase dobrou. Em 2008, 10% dos homens e 14% das mulheres (meio bilhão de pessoas) no mundo eram obesas, comparadas a 5% dos homens e 8% das mulheres em 1980 (WHO, 2012). No entanto, esse problema não se restringe somente aos adultos. Desde o início da década de 1990, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) têm alertado que a obesidade infantil representa um problema de saúde pública que tem tomado proporções crescentes, principalmente nos países industrializados.
Ao mesmo tempo em que ocorre uma redução contínua da desnutrição, observa-se um aumento do excesso de peso e, por conseguinte, da prevalência de doenças crônicas não transmissíveis. Nos últimos 30 anos, a prevalência da obesidade infantil no Brasil aumentou em todas as regiões brasileiras e classes sociais, atingindo valores que variam entre 5 e 18% (Taddei et al., 2004).O desenvolvimento do sobrepeso na infância tem sido associado ao peso elevado ao nascer, menor escolaridade e sobrepeso materno. No entanto, os achados sobre os determinantes do sobrepeso são pouco consistentes, que pode ser, em parte, atribuído a variações metodológicas entre as pesquisas.
Em um estudo realizado por pesquisadores dos Departamentos de Nutrição das Universidades Federais de Pernambuco (UFPE) e de Alagoas (UFAL) foi investigada a prevalência do excesso de peso e a sua associação com fatores socioeconômicos, biológicos e maternos em menores de 5 anos da região semi-árida do estado de Alagoas, que se caracteriza por ser uma região com infraestrutura de serviços públicos precária e indicadores sociais ruins.
A prevalência do excesso de peso na população estudada foi de 28,5%, bem acima da estimativa para crianças brasileiras. Dos 963 menores de 5 anos avaliados, 192 crianças (19,9%) estão em risco de sobrepeso, 63 (6,5%) com sobrepeso e 20 (2,1%) com obesidade. Entre os determinantes para o excesso de peso relacionados à criança, apenas a duração de aleitamento materno não exclusivo esteve associada ao desfecho. Observou-se que a chance de excesso de peso foi de 1,8 vezes maior entre as crianças que foram amamentadas por um período inferior a 6 meses. Em relação aos fatores maternos, o excesso de peso da criança foi associado à obesidade materna (medida da circunferência da cintura) (Moreira e colaboradores, 2012).
Apesar da associação entre os piores indicadores socioeconômicos o e excesso de peso ser consistente em pesquisas realizadas em países desenvolvidos, o mesmo não foi encontrado na população estudada. A ausência dessa associação pode ter relação com o processo de transição nutricional, conforme discutido por Moreira e colaboradores. Enquanto nos países desenvolvidos a prevalência de excesso de peso entre crianças é maior entre aquelas pertencentes a estratos socioeconômicos menos privilegiados, nos países em desenvolvimento, o excesso de peso em crianças tende a ser mais prevalente em famílias com melhores condições socioeconômicas. Os autores ressaltam que no Brasil, o aumento da ocorrência do excesso de peso infantil tem atingido inclusive famílias de baixo poder aquisitivo.
É importante também ressaltar a mudança do perfil da insegurança alimentar vivenciada por essas famílias de baixa condição socioeconômica. A percepção que os indivíduos têm a respeito de sua alimentação, que não levam em consideração informações diretas sobre o seu estado nutricional, é influenciada por valores culturais e sociais. Assim, observa-se uma tendência entre aqueles de baixa renda para adquirir hábitos dietéticos dos estratos de renda mais altos. “Optam” por comprar alimentos ricos em açúcar e pobres em vitaminas e fibras (biscoitos, p.ex.), e um novo panorama se revela: crianças apresentam simultaneamente excesso de peso e déficits nutricionais.
Em um estudo desenvolvido em Feira de Santana, na Bahia, observou-se que a taxa de sobrepeso das crianças se associou ao peso ao nascer, isto é, a probabilidade de ter sobrepeso foi maior para as crianças que nascem com peso mais elevado. Além disso, notou-se maior ocorrência de sobrepeso entre as crianças filhas de mães primíparas, ou seja, ter dois ou mais irmãos parece ser fator de proteção para o sobrepeso. O trabalho materno aos 4 meses de vida da criança também apresentou associação com o sobrepeso. Segundo os autores, as crianças cujas mães já trabalham no quarto mês após o nascimento do bebê são mais precocemente desmamadas e introduzidas no consumo dos alimentos da família, estando mais susceptíveis ao sobrepeso.
A prevalência de excesso de peso em crianças menores de 5 anos é apresentada por ano e região como indicador de condição de vida (Ind010302) no nosso Observatório sobre Iniquidades em Saúde. Os períodos avaliados foram 1989 (Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição -PNSN), 1996 e 2006 (Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde – PNDS).Os dados indicam que a prevalência de excesso de peso no Brasil apresentou uma redução importante entre as avaliações de 1989 e 1996, exceto na região Nordeste, que aumentou de 6,5% para 7,9% nesse período. A região Sul foi a que apresentou maior redução de excesso de peso em crianças, cujas prevalências foram de 12,1% em 1989e 6,6% em 1996.
Entre 1996 e 2006 a prevalência de excesso de peso em crianças menores de 5 anos reduziu discretamente nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste. No entanto, as regiões Sul e Centro-Oeste apresentaram entre 1996 e 2006 um aumento dessa prevalência de até aproximadamente 30%. No que diz respeito às diferenças regionais, em 2006 a região que apresentou maior prevalência foi a Sul, com 8,9%, e a menor foi a Norte, com 5,9%.
A transição nutricional é um fenômeno que pode ser traduzido como um dos maiores desafios para as políticas públicas no momento e exige um modelo de atenção à saúde pautado na integralidade do indivíduo com uma abordagem centrada na promoção da saúde. A obesidade na infância apresenta relevância não apenas em virtude das comorbidades associadas, tais como o maior risco de dislipidemias, alterações no metabolismo da glicose e insulina e hipertensão, além de predizer a obesidade na vida adulta.
A obesidade infantil também é relevante devido às consequências psicossociais, incluindo a baixa autoestima, depressão, ansiedade, isolamento e culpa. Sendo assim, a promoção da saúde e abordagens preventivas para o controle e redução da obesidade são necessárias e compreendem uma estratégia mais efetiva quando implantada ao grupo etário infantil, visto que a obesidade na infância pode se perpetuar na vida adulta, dificultando seu controle no futuro (WHO, 2000).
Referências Bibliográficas
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Taddei JA, Colugnati FA, Rodrigues EM. Transição nutricional em menores de cinco anos: evidências dos inquéritos antropométricos brasileiros. In: Cardoso AL, Lopes LA, Taddei JA, editores. Tópicos em nutrição pediátrica. São Paulo: Atheneu; 2004. p.11-43.
World Health Organization. World Health Statistics: A Snapshot of Global Health. Geneva: WHO; 2012.
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