Insegurança alimentar ainda atinge quase metade dos Nordestinos

(Imagem: http://opolifonico.wordpress.com/)

A insegurança alimentar – não acesso regular e permanente à alimentação em quantidade e qualidade adequadas – ainda atinge 30,2% dos domicílios brasileiros. A região mais afetada por este problema é o Nordeste, onde 46,1% dos domicílios sofrem algum tipo de insegurança alimentar, enquanto no Sul o número não passa de 18,7%. Os números, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística em 2009, revelam as diferenças encontradas no território nacional no que diz respeito a um dos fatores mais básicos para a qualidade de vida e saúde dos brasileiros: a alimentação.

No Nordeste, os estados mais afetados pela insegurança alimentar são Maranhão, com 64,6% de prevalência, Piauí, com 58,6% e Ceará, com 48,3%. O estado nordestino com melhor resultado foi Alagoas, com 37,1% de domicílios afetados por algum tipo de insegurança. Em Santa Catarina, no Sul, a incidência de insegurança alimentar foi de 14,8%. As desigualdades registradas são ainda mais intensas nas áreas rurais. Enquanto 4,6% dos domicílios urbanos brasileiros apresentam insegurança alimentar grave, na área rural esse número chega a 7%.

Para o pesquisador e docente do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip-PE), Malaquias Batista Filho, a razão das diferenças do Nordeste para as outras regiões é a mesma que reflete na desigualdade entre o espaço urbano e as áreas rurais. O professor associa a insegurança alimentar à pobreza e às dificuldades socioeconômicas enfrentadas pela população. “No meio rural não há pleno emprego, os riscos na produção agropecuária são maiores, principalmente nas áreas mais atrasadas. Existe a própria questão da extrema variação nos preços de produtos agrícolas nos mercados locais ou nacionais. Esta instabilidade econômica gera insegurança”, explica.

É o que também acredita o médico do Centro Nordestino de Medicina Popular, Celerino Carricone, que destaca a insegurança alimentar entre as populações permanentemente vulneráveis no território nordestino, como as comunidades indígenas e afrodescendentes. Segundo Carricone, em termos de produção, o Brasil tem plenas condições de atender à demanda de sua população. “O mundo, em especial o Brasil, produz suficientes alimentos para toda sua população. Porém, na acessibilidade ao alimento é que está o problema maior e esta acessibilidade está ficando mais problemática por causa da atual crise de alimentos, cuja  produção e distribuição são dominadas por 10 grandes multinacionais”, defende.

Pesquisa realizada pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) associou o programa de distribuição de renda do Governo Federal, o Bolsa Família, à melhora na qualidade e quantidade de alimentos consumidos pelos beneficiários. Segundo o estudo, que se baseou nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) realizada pelo IBGE em 2008 e 2009, o Bolsa Família permitiu às famílias beneficiadas aproximadamente mais 100 kcal diárias por pessoa. O aumento foi no consumo de alimentos saudáveis e não houve diferenças no que diz respeito ao consumo de alimentos industrializados, com maior quantidade de sal, açúcar e gorduras.

Para Carricone, além do acesso, também é importante avaliar o padrão alimentar e a qualidade daquilo que é consumido. O médico atenta para uma queda no consumo de farinhas, féculas e massa, cereais e leguminosas no país, incluindo arroz, feijão e hortaliças. Ele também menciona como preocupante a elevação no consumo de refrigerantes e cervejas, dados que também são identificados na Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE. “Este modelo alimentar tem resultado num quadro epidemiológico com aumento das doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão e obesidade. De acordo a mesma pesquisa, 49% dos brasileiros já se acham acima do peso e pior ainda no caso das crianças, onde 33,5% são gordas e 14,3% obesas. A segurança alimentar pressupõe que o alimento deve ser seguro do ponto de vista nutricional, de conservação e de higiene”, explica.

O grande desafio para o Nordeste é superar as desigualdades socioeconômicas como uma forma de proporcionar à população melhores condições de vida. Mais do que garantir o acesso dos nordestinos aos alimentos, é preciso formar uma população consciente da importância de uma alimentação apropriada, que forneça os nutrientes adequados e promova mais saúde às famílias. O caminho, que começou a ser percorrido com políticas e iniciativas voltadas ao crescimento econômico, a produção de bens e serviços e sua distribuição de forma igualitária, com mais distribuição de renda, ainda é longo e carece de mais atenção e participação dos gestores. “Como receita a equação é simples. Como aplicação, o processo se complica, porque criamos e mantemos estruturas e funções injustas na organização social, que é um processo histórico. Acabar com a insegurança alimentar é corrigir as distorções que geram as grandes desigualdades”, conclui o professor Malaquias.

Referências Bibliográficas

Bolsa Família melhora disponibilidade de alimento saudável [Internet]. São Paulo: Portal Vermelho; 2013 Jun 16 [acesso em 05 jul 2013]. Disponível em: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=1&id_noticia=216038

IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2004/ 2009: prevalência de insegurança alimentar em domicílios particulares, por tipo de insegurança alimentar e classes de rendimento domiciliar per capita, segundo as Grandes Regiões e o sexo da pessoa de referência – 2004/2005. Rio de Janeiro. [acesso em 05 jul 2013]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/seguranca_alimentar_2004_2009/tabelas_pdf/tab1_07_2.pdf

IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Segurança Alimentar 2004/ 2009: distribuição dos domicílios particulares, por situação de segurança alimentar e tipo de insegurança alimentar, segundo a situação do domicílio, as Grandes Regiões e as Unidades da Federação – 2004/2009. Rio de Janeiro. [acesso em 05 jul 2013]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/seguranca_alimentar_2004_2009/tabelas_pdf/tab1_09_2.pdf

Insegurança alimentar diminui, mas ainda atinge 30,2% dos domicílios brasileiros [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 Nov 26 [acesso em 05 jul 2013]. Disponível em: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=1763

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