Terapia fotodinâmica recomendada pela Conitec foi desenvolvida em universidade brasileira com investimento público nacional
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) recomendou a incorporação no SUS da terapia fotodinâmica que poderá ser mais uma alternativa para o tratamento de pacientes com câncer de pele no Brasil. De baixo custo e fácil produção, o aparelho foi projetado pelo Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP), considerado único no mundo com duplo sistema na mesma plataforma: permite o diagnóstico e o tratamento de câncer, sendo capaz de avaliar e tratar a doença no mesmo dia, evitando mutilações e procedimentos dolorosos. A tecnologia faz parte do projeto Terapia Fotodinâmica Brasil (TFD) que começou em 2012, na USP, e envolveu instituições de pesquisas, empresas e hospitais para tornar a técnica aplicável em larga escala. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi a fonte geral de financiamento para o desenvolvimento da técnica, além do programa de fomento da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) em conjunto com o Ministério da Saúde, para o desenvolvimento do equipamento. Essa é a primeira demanda de uma universidade para incorporação de uma tecnologia no SUS, um case de sucesso da inovação tecnológica no país.
“As universidades brasileiras tem papel central na inovação, reconhecendo as necessidades do SUS, impulsionando a pesquisa, desenvolvimento e inovação, produzindo evidências clínicas, capacitando os serviços de saúde e participando do processo de incorporação e oferta de uma nova tecnologia no SUS”, afirmou a diretora do Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde (DGITS), Luciene Bonan.
O demandante para incorporação foi a USP e o Núcleo de Avaliação de Tecnologias da UNIFESP (membro da REBRATS) atuou como NATS colaborador do Ministério da Saúde na análise dessa demanda.
A Conitec, no retorno da consulta pública sobre o tema, apresentado na última quarta-feira (28), durante a 120ª Reunião, observou que há bom resultado da terapia fotodinâmica para pacientes com câncer de pele não melanoma do tipo carcinoma basocelular superficial e nodular, e que ela se mostra como alternativa segura e eficaz para os casos em que a intervenção cirúrgica não é recomendada.
O carcinoma basocelular é o mais frequente entre todos os tipos de câncer malignos diagnosticados, e a primeira linha de tratamento é a cirurgia para a retirada das lesões. No entanto, a Comissão também observou que, nos casos de pacientes que não podem passar pela cirurgia ou que foram diagnosticados com tumores de baixo risco, há vantagens do procedimento em relação à cirurgia pelo fato de se tratar de um procedimento ambulatorial e não demandar grande infraestrutura. Além disso, considerou-se na recomendação final favorável à incorporação no SUS, que já existem profissionais capacitados e estrutura instalada com o equipamento, em dezenas de serviços públicos de saúde.
A proposta ainda se revelou como um tratamento com eficácia a longo prazo. As amostras de ensaios clínicos conduzidos pelos pesquisadores brasileiros em centros de referência em oncologia indicam que as lesões apresentam taxas mínimas de recidiva após o tratamento com a terapia fotodinâmica, e o índice de cura da doença se mantém em 90%.
A incorporação da tecnologia foi recomendada pela Conitec conforme Protocolo de Uso do Ministério da Saúde. A decisão agora é do secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde do Ministério da Saúde (SECTICS/MS), sendo publicada posteriormente no Diário Oficial da União (DOU).
Na prática
Nessa modalidade de tratamento, a lesão é preparada para receber a aplicação de um agente fotossensibilizante (medicamento metil-ALA em creme) na área afetada. A luz é irradiada com um comprimento de onda adequado para ativar o fotossensibilizador, ocasionando a destruição do tumor. O fotossensibilizador é aplicada de forma tópica, permitindo o tratamento de mais de uma lesão e a repetição da terapia. Todo o processo pode ser realizado no próprio consultório médico e o tratamento pode começar poucas horas depois de diagnosticada a doença.
Histórico da tecnologia na Conitec
Essa não é a primeira vez que a Conitec avalia a tecnologia. O primeiro pedido de avaliação foi protocolado pela USP em 2018. Em 2020, os membros presentes na 85ª Reunião Ordinária deliberaram, por unanimidade, não recomendar a incorporação da terapia no SUS, como alternativa à cirurgia. A portaria com a decisão do Ministério da Saúde foi publicada em março daquele ano. Na ocasião, restaram dúvidas quanto a uma possível dificuldade de garantir o uso do procedimento somente em tumores superficiais, e o quão segura e custo-efetiva a tecnologia se mostrava para o tratamento de carcinoma basocelular quando comparada à cirurgia para retirada de lesões na pele.
Outra solicitação de avaliação chegou à Secretaria-Executiva da Conitec em setembro de 2022, quando a USP protocolou nova demanda para análise da terapia fotodinâmica com cloridrato de aminolevulinato de metila – metil-ALA para o tratamento de câncer de pele não melanoma do tipo carcinoma basocelular superficial e nodular. A Comissão, durante a 116ª Reunião Ordinária, em março deste ano, deliberou que a matéria fosse disponibilizada em consulta pública com recomendação preliminar desfavorável, mas, por suscitar novos questionamentos, o tema foi levado também à Subcomissão Técnica do Comitê de Produtos e Procedimentos. A medida ocorreu por necessidade de informações técnicas e administrativas adicionais a serem sanadas junto às áreas técnicas do Ministério da Saúde, de modo a subsidiar a avaliação da Conitec. Na oportunidade, o Comitê levantou questões como a falta de dados sobre os pacientes elegíveis a esse tipo de procedimento; a população não elegível à cirurgia (quantitativo, tratamento disponível no SUS); e sobre o registro na Anvisa: equipamento e medicamento (tecnologia utilizada em conjunto com medicação específica).
Com a discussão concluída na Subcomissão e com os resultados da avaliação qualitativa das contribuições enviadas na consulta pública, observou-se o compartilhamento de informações não disponíveis na literatura, de conhecimento empírico, com relatos de vida real sobre a experiência com a tecnologia e com a condição clínica. Assim, na avaliação final, foi notável o aprimoramento no processo de definição da demanda e elaboração do parecer, especialmente na definição da população e condição clínica. Concluiu-se, portanto, que o procedimento não é comparado à cirurgia, mas que tem espaço e relevância como opção menos agressiva aos pacientes que aguardam cirurgia ou que por algum motivo não podem fazê-la, como em casos de idade avançada, múltiplas lesões em áreas nobres e funcionais por exemplo.
Ao apresentarem ao Comitê informações sobre produção e fornecimento, os pesquisadores atestaram que as empresas que integram o projeto já são estabelecidas, com capacidade para ampliação da escala de produção para atender a demanda necessária do sistema público de saúde. Destacaram que a tecnologia foi reconhecida recentemente pela Unesco como tecnologia viável também para países com dificuldades estruturais em saúde.
O retorno da demanda na Conitec e toda condução da demanda em Comitê especializado, como foi o caso da avaliação no Comitê de Produtos e Procedimentos, evidencia a qualificação das discussões e que o processo de avaliação de tecnologias em saúde é passível de avanços, com amadurecimento dos dados, busca da correta necessidade assistencial para trazer mais benefícios aos pacientes e ao SUS.
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