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O estudo e a compreensão da utilização dos serviços de saúde é uma boa ferramenta para medir o acesso à assistência de saúde. Utilizando os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio (PNAD), pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), analisaram a evolução do perfil das pessoas que utilizaram os serviços de saúde entre 2003 e 2008 no Brasil. De acordo com as características socioeconômicas dos usuários, o tipo de atendimento e de serviço, e os motivos da procura.
Silva Moreira e colaboradores fazem notar que um cuidado especial, é necessário na interpretação dos dados sobre utilização, pois “a efetiva utilização decorre de uma complexa combinação de fatores, que inclui desde a necessidade, a percepção, as características sóciodemográficas e os valores do indivíduo, até a organização e a forma de financiamento do sistema de saúde”. No caso do Brasil, o sistema de saúde público (SUS), coexiste com um segmento complementar baseado na oferta de seguros e planos de saúde (de adesão voluntaria ou através do empregador) e, em menor medida, pelo pagamento direto no ato de consumo do serviço. Isto quer dizer, que o SUS responde pela saúde de 190 milhões de indivíduos enquanto os planos de saúde privados respondem por 49,2 milhões. Esses últimos representam uma cobertura duplicada para 25,9% da população (são cobertos tanto pelo SUS quanto pelo plano privado).
Na pesquisa “a utilização de serviços de saúde foi medida pela proporção de pessoas que procuraram e foram atendidas nas duas semanas anteriores à pesquisa, e pela proporção dos que relataram internação nos últimos 12 meses, classificados segundo atendimento SUS e não-SUS”. Além disso, o perfil dos usuários foi identificado a partir de variáveis como sexo, idade, cor da pele (autorreferida), escolaridade, renda familiar per capita, posse de plano de saúde e região de residência. No caso de utilização de serviços as variáveis foram, tipo de atendimento, tipo de serviço e motivos referidos da procura pelo serviço. No que segue apresentamos os principais resultados do estudo.
Resultados
Os pesquisadores não acharam diferenças significantes entre 2003 e 2008 no perfil sociodemográfico das pessoas que procuraram atendimento em serviços de saúde; existe maior procura de serviços por mulheres (17% contra 12% dos homens); aumenta a procura por serviços em função da idade (12% em 0-14 anos para 23% acima dos 60 anos) e nos extremos de escolaridade; também aumenta quando aumenta a renda familiar per capita. As pessoas que possuem plano de saúde procuram serviços mais frequentemente do que aqueles que não os possuem (19% contra 13%). Nos motivos referentes à procura do serviço, também não houve diferença: mais de 50% dos entrevistados alegaram motivo de doença tanto em 2003 quanto em 2008; atividades de prevenção como pré-natal, vacinação e outros, constituíram o segundo motivo mais frequente de procura de serviços, observando-se um declínio na proporção (31,3% em 2003 contra 24,7% em 2008). O SUS foi responsável pelo atendimento de 58,5% dos entrevistados em 2003 e por 56,7% em 2008 (Resultados não mostrados).
Quanto ao perfil sociodemográfico (2003-2008) os pesquisadores mencionam diferenças apenas em relação à escolaridade e à posse de plano de saúde privado. Existe um aumento da proporção de usuários SUS nos grupos de escolaridade mais elevada e em indivíduos com planos de saúde privados. Em matéria de internações não houve diferenças significantes entre 2003 e 2008, sendo que 7% dos entrevistados afirmaram internação nos últimos 12 meses e deles 67,5% em 2003 e 68,3% em 2008, foram internados no SUS (Tabela 1).
O percentual de procura por atendimento e de utilização do SUS foram distintos entre as regiões do país, mas sem alteração entre 2003 e 2008. As regiões norte e nordeste foram as que mais utilizaram o SUS (quase 70%) (Tabela 4); pode se dizer que a região sudeste foi a que em menor proporção o utilizou. Os autores concluem: “Este padrão de utilização do SUS por região esteve inversamente correlacionado com a posse de planos privados de saúde em 2003 e 2008. Isto é, quanto menor a posse maior a proporção de utilização”. Como consequência, o SUS foi responsável por cerca de 80% das internações e de 70% das consultas médicas nas regiões do norte e nordeste (Tabela 4).
Alguns dos achados do estudo mostram que: ainda que observado um crescimento de 70,6% nas consultas odontológicas realizadas em serviços do SUS, este foi insuficiente para alterar o padrão de acesso aos serviços, que continua sendo predominantemente privado. O SUS responde por menos de 1/3 destes atendimentos; mesmo assim, chama a atenção à elevada proporção do uso de consultas odontológicas SUS, no nordeste, talvez explicado pela elevada presença do Programa Saúde da Família na região e do Programa Brasil Sorridente a partir de 2004 (Tabela 5). Doença e prevenção continuaram sendo os principais motivos de busca por serviços tanto em 2003 quanto em 2008; se manteve a tendência de maior utilização de serviços preventivos entre pessoas com maior escolaridade, renda e plano de saúde (Tabela 5).
Como principais alterações do período 2003-2008 os autores mencionam a diminuição proporcional da busca por atendimentos preventivos e o aumento da busca de serviços devido a problemas odontológicos e de reabilitação, tanto no segmento SUS como não-SUS (Tabela 3). Permaneceram desigualdades regionais existentes no país em relação à procura por atendimentos de saúde e de utilização. O padrão de utilização de serviços SUS existente no país (maior frequência de utilização no norte e nordeste, e menor no Sudeste) mostra que a articulação dos sistemas público e privado ocorre de forma distinta nas cinco macrorregiões.
Discussão
Até aqui apresentamos alguns dos resultados mais chamativos da pesquisa feita por Silva Moreira e colaboradores. No ponto dedicado à discussão, no artigo, destaca-se a necessidade de geração de conhecimentos, métodos e tecnologia que dê suporte ao desenvolvimento do SUS; estudos como este podem orientar ao desenho das políticas de saúde e de melhoria do desempenho. Os autores assinalam que as informações produzidas pela PNAD permitem conhecer a cobertura dos serviços segundo o tipo de financiamento que as pessoas têm, e como essa condição interfere no uso dos serviços. No entanto a busca de serviços de saúde não é uma função exclusiva da necessidade, mas de diversas determinações que explicam variações entre grupos sociais, áreas e oferta de serviços. Este estudo considerou os indivíduos que procuraram atendimento sem ter conta das necessidades de saúde que deram origem à busca desses serviços.
Os autores finalizam o artigo destacando a importância de estudos sobre a procura e a utilização de serviços de saúde. O conhecimento produzido por esses estudos pode melhorar a organização da assistência estabelecendo níveis de cobertura segundo atributos dos indivíduos e distribuição regional permitindo a identificação de grupos populacionais mais vulneráveis. A partir desse conhecimento podem ser elaboradas políticas de saúde com atuação nos determinantes sociais capazes de alcançar as metas que o nosso sistema universal de saúde estabelece e almeja. Concluímos este resumo com as palavras de Silva Moreira e colaboradores: “O SUS é um sistema que se apoia no conceito de cidadania ao estabelecer como diretriz o acesso universal e integral à atenção à saúde. Se essa característica é uma virtude do sistema brasileiro, tal proposição, no entanto, se constitui no desafio de atender uma população de 190 milhões de pessoas”. A produção de conhecimento a partir das informações da PNAD por exemplo, constitui um elemento chave para o avanço e aprimoramento do sistema.
Referência Bibliográfica
da Silva ZP, Ribeiro MC, Barata RB, de Almeida MF. Perfil sociodemográfico e padrão de utilização dos serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), 2003- 2008. Ciên Saúde Colet [periódico na internet]. 2011 [acesso em 19 mar 2012];16(9):3807-16. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S1413-81232011001000015&lng=en&nrm=iso&tlng=pt
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