Avanços no complexo industrial da saúde contribuirão para reduzir desigualdades em saúde na região

O mercado mundial do Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS) é avaliado em 1 trilhão de dólares. O Brasil tem uma fatia de 1,2% deste mercado, enquanto cerca de 80% está concentrado nos Estados Unidos, Alemanha, França, Holanda e Japão. No Brasil, o setor Saúde representa cerca de 8% do Produto Interno Bruto (PIB) e movimenta R$ 160 bilhões por ano. Apesar disto, o país ainda depende da produção estrangeira para suprir suas demandas. Para aquecer a participação brasileira na indústria mundial farmacêutica e de equipamentos de saúde, o Governo Federal investe no CEIS e pretende, com a produção nacional, gerar uma economia de R$ 3 bilhões por ano.

Coordenado pelo Ministério da Saúde e um dos eixos do programa Mais Saúde, o CEIS também faz parte da Política de Desenvolvimento Produtivo nacional e conta, ainda, com a participação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). A ideia da proposta do Governo Federal é reduzir o déficit na balança comercial de produtos na área da saúde – que em 2008 foi de U$7,13 bilhões –, aumentar a participação brasileira no comércio mundial e impulsionar a indústria farmacêutica e de equipamentos de saúde no país. As mudanças no cenário do CEIS no Brasil podem promover mais qualidade de vida e representar uma grande melhoria nas condições de saúde dos brasileiros.

A maior autonomia brasileira diante da indústria da saúde é uma forma de garantir à população o acesso a medicamentos importantes, desde à atenção básica aos insumos para tratamento de doenças específicas, como alguns tipos de câncer. A meta do Ministério da Saúde é que em 2017 o Brasil garanta 100% da fabricação de 14 biológicos utilizados no tratamento de doenças como hemofilia, esclerose múltipla, artrite reumatoide e diabetes. Para preparar as instituições públicas, o Governo conta com o processo de transferência tecnológica de laboratórios privados para públicos. Fruto deste processo, o Instituto Butantan conquistou, em 2013, o domínio da produção da vacina contra a influenza e foi responsável pela produção de 6,5 milhões de doses aplicadas. Em 2015, espera-se que o Butantan se responsabilize por toda a demanda nacional do insumo. Ao todo, 17 laboratórios privados vão transferir tecnologia para oito instituições públicas, como ferramenta de garantia da autonomia nacional.

Para o médico e vice-presidente de Produção e Inovação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Jorge Bermudez, a iniciativa no campo da saúde reflete no desenvolvimento nacional. “O Complexo Econômico Industrial da Saúde consegue relacionar saúde e desenvolvimento no campo da economia política da saúde, dado que traz, na sua definição, as relações e contradições entre o econômico e social, propondo superar a dicotomia entre a vertente produtiva e sanitária da saúde”, afirma. Bermudez defende, ainda, que o desenvolvimento do setor pode contribuir com a melhoria da situação da saúde pública no Brasil. “O desenvolvimento do segmento de base química e biotecnológica impacta diretamente a capacidade da prestação universal de serviços no Brasil, dado que é responsável pela produção de medicamentos, fármacos, vacinas e soros, hemoderivados e reagentes para diagnóstico”, explica.

É o que também acredita o Presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, Antônio Carlos Figueiredo, que confia no CEIS como uma ferramenta na construção de uma sociedade com mais igualdade. “Os investimentos no Complexo Econômico Industrial da Saúde são de extrema relevância para o SUS, pois, a médio e longo prazos, traduzem-se em mais saúde, renda e qualidade de vida para a população”. Figueiredo acredita que não é possível avançar na saúde pública ignorando o conhecimento e a inovação. “A oferta do direito à saúde está intimamente ligada ao fortalecimento de uma base produtiva que suporte esta demanda. A saúde, habitualmente, não é considerada uma atividade econômica pelos profissionais da área. No entanto, ela é fundamental tanto para o conhecimento da estrutura produtiva e da dinâmica do setor – incluindo seu financiamento, inter-relações com o resto da economia e destinação dos bens e serviços produzidos -. quanto para a formulação e implementação de políticas com vistas ao aumento da eficiência na aplicação dos recursos públicos e à melhor distribuição dos benefícios de saúde à população”, avalia.

O panorama nacional se mostra favorável ao desenvolvimento que vem sendo galgado a partir dos investimentos na área. Em 2011 a indústria farmacêutica mundial faturou U$ 840 bilhões, nos quais o Brasil teve uma participação de 2,26%. “A indústria segue em um movimento de incorporação de novas competências para a produção de produtos para a saúde como, por exemplo, os medicamentos biológicos, os kits para diagnóstico, vacinas. Essas competências são multidisciplinares e incluem conhecimentos em áreas como biotecnologia, nanotecnologia, engenharia genética, bioinformática, genômica e proteômica”, explica Bermudez.

No ritmo das propostas do Governo Federal, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos da Fiocruz (Biomanguinhos), maior laboratório público do país, tem um papel importante do Complexo Industrial da Saúde. Em 2012, 103 milhões de doses de vacinas, 8,79 milhões de reativos para diagnósticos e 11 milhões de frascos de biofármacos foram entregues ao Ministério da Saúde. “Também investimos no desenvolvimento interno de vacinas, como a vacina meningocócica B, que deu um importante passo em ao concluir a fase II do seu estudo clínico, quando foi avaliada a proteção em crianças de 4 a 11 anos com o esquema de três doses. Este projeto reafirma a capacidade do Instituto em desenvolver novas vacinas com foco na situação epidemiológica do país”, explica o diretor de Biomanguinhos, Artur Couto.

Para Couto, as propostas do Governo Federal para o fortalecimento do CEIS podem contribuir com a redução das iniquidades em saúde do país. “Podem reduzir uma vez que ampliam o número de produtos disponíveis na rede pública de saúde, através do fortalecimento do SUS. Com isso, a população passa a ter acesso a imunobiológicos de alto valor agregado e de alto custo. Além disso, uma vez que laboratórios públicos passam a produzir tais medicamentos – com incentivos das políticas públicas vigentes -, as despesas do Governo Federal são reduzidas consideravelmente, já que não precisa recorrer às farmacêuticas multinacionais para disponibilizar produtos de qualidade à sociedade”, defende.

É o que também acredita Jorge Mendonça, vice-diretor de Gestão Institucional do Instituto de Tecnologia em Fármacos da Fiocruz (Farmanguinhos), instituição que recebeu investimentos para a recuperação da planta fabril e que tem incluído novos medicamentos em sua linha de produção. “Farmanguinhos trabalha para disponibilizar novos medicamentos a preço justo para o Ministério da Saúde. Assim, conseguimos cumprir nossa função de produtor púbico e de regulador de mercado de medicamentos considerados estratégicos. Desta forma, colaboramos com a ampliação e garantia de acesso à assistência farmacêutica à população brasileira, através do SUS, assim como com a sustentabilidade dos programas mantidos pelo Governo Federal”, avalia.

Em sintonia com o panorama do CEIS no país, o Nordeste começa a alcançar novas perspectivas. Em 2014, em Goiana, Zona da Mata de Pernambuco, começará a funcionar plenamente a fábrica da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás), estatal vinculada ao Ministério da Saúde. “Vamos produzir medicamentos fundamentais para milhares de pessoas com hemofilia, imunodeficiência primária, câncer, Aids, cirrose e queimaduras graves, além de pessoas em tratamento de terapia intensiva. Todos os medicamentos da Hemobrás serão distribuídos gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS)”, explica Romulo Maciel Filho, presidente da estatal.

Além de Pernambuco, o estado do Ceará também se prepara para receber o Polo Industrial e Tecnológico da Saúde, no município de Eusébio, na Região Metropolitana de Fortaleza. “Lá, entre outras unidades industriais, a Fiocruz irá contar com a parceria de empresas estrangeiras para desenvolver, inicialmente, medicamentos para combater a doença de Gaucher, que é uma anomalia genética rara, e uma vacina contra a febre amarela. As duas empresas estrangeiras ajudarão no desenvolvimento biológico a partir de célula vegetal”, revela Jorge Bermudez. Segundo o Ministério da Saúde, essa será a primeira fábrica do País a produzir medicamentos a partir de vegetais, como a cenoura e o tabaco. A previsão é que a fábrica da Fiocruz no Ceará comece a operar em 2016.

Os investimentos propostos pelo Governo Federal são de grande importância pela preocupação em resgatar a produção nacional e viabilizar a participação brasileira no mercado internacional de saúde. No entanto, é imprescindível que este novo cenário represente uma perspectiva de mudança significativa na vida dos brasileiros. Mais do que a representatividade econômica do CEIS, é preciso que todos os investimentos feitos consigam proporcionar uma realidade com mais equidade no país, promovendo uma mudança consistente na vida das famílias brasileiras. É preciso que os milhões que serão economizados nos próximos anos gerem também novos investimentos, que consigam impactar positivamente na vida da população. Os passos dados pelo Estado devem repercutir diretamente nos índices de mortalidade, no acesso aos serviços de saúde, desde a atenção básica até os atendimentos mais complexos, democratizando o acesso aos serviços de saúde.

Referências Bibliográficas

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Hemobrás – Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia [homepage na internet]. Brasília/Recife; c2013 [atualizado em 01 ago 2013; acesso em 01 ago 2013]. Disponível em: http://www.hemobras.gov.br/site/conteudo/index.asp

Instituto Butantan [homepage na internet]. São Paulo; c2013 [atualizado em 01 ago 2013; acesso em 01 ago 2013]. Disponível em: http://www.butantan.gov.br/home/

 

Por Maira Baracho . 02/08/2013

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