Encerramento: Carta do Recife traz compromissos firmados da 1ª Conferência Regional sobre Determinantes Sociais na Saúde do Nordeste

Isabel Senra, da Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, e Sinval Brandão Filho, diretor da Fiocruz Pernambuco, fizeram o encerramento do evento (Imagem: Keila Vieira)
Isabel Vilas Boas, do Ministério da Saúde, e Sinval Brandão, diretor da Fiocruz Pernambuco, fizeram o encerramento do evento (Imagens: Keila Vieira)

Após três dias de discussões e debates, chegou ao fim a 1ª Conferência Regional sobre Determinantes Sociais na Saúde do Nordeste. Durante o evento, que aconteceu no Recife, gestores, especialistas e representantes da sociedade civil dialogaram e refletiram sobre as principais demandas do povo nordestino, sob a perspectiva da determinação social na saúde.

No encerramento o coordenador geral do evento e diretor do Centro de Estudos sobre DSS da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), Alberto Pellegrini, agradeceu o envolvimento das diversas instituições parceiras na realização da 1ª CRDSS NE: Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems), Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), BNDES, Fiocruz Pernambuco, Fiocruz do Rio de Janeiro, Governo de Pernambuco e Prefeitura do Recife. “Estes parceiros garantiram o apoio financeiro, técnico e político necessário para realizar o evento”, frisou. Pellegrini agradeceu, ainda, a todos os palestrantes e debatedores que proporcionaram uma discussão consistente sobre os temas mais relevantes da determinação social da saúde da população do Nordeste.

Durante a cerimônia de encerramento, o diretor da Fiocruz Pernambuco, Sinval Brandão Filho, destacou a importância do evento como contribuição na formulação de políticas públicas que atinjam a população. Brandão também fez a leitura da Carta do Recife, elaborada como desdobramento das discussões realizadas durante o evento. No documento foram pontuados os principais compromissos e recomendações da conferência, reafirmando as necessidades identificadas e colocando as metas discutidas durante a 1ª CRDSS, que abrangem questões como o fortalecimento da participação social, o comprometimento das três esferas de governo, o combate ao racismo e discriminação, o enfrentamento aos impactos da seca e a interação de governo, sociedade civil especialistas.

Maria Inês Barbosa destacou a regionalização das discussões
Maria Inês Barbosa destacou a regionalização das discussões

Representando o Ministério da Saúde, Isabel Vilas Boas reforçou a importância de sempre debater os DSS e da oportunidade de fazê-lo no Nordeste. “Acho que essa discussão dos determinantes sociais na saúde precisa ser enfrentada, precisa ser a base do processo de planejamento da saúde. A CRDSS foi um momento muito importante para isto. Estamos no momento de construção dos planos municipais de saúde e o evento acontecer no Nordeste, com a participação do governo e da sociedade civil é muito importante e pode enriquecer a construção de planos de saúde que estão aí por vir”, afirmou.

Para a representante da Opas, Zohra Abaakouk, a 1ª CRDSS reafirmou o papel importante do Brasil no enfrentamento às desigualdades e seu destaque nos debates sobre DSS. “Foi um evento muito bem preparado, com o cuidado de convidar e agregar várias pessoas para fazer essas discussões. Foi muito importante por termos conseguido debater vários pontos que se referem às especificidades da região Nordeste: aspectos culturais, sociais e econômicos. Foi importante começar pelo Nordeste, que é uma região de muitas riquezas, mas, também de muita desigualdade. Essa 1ª CRDSS foi uma maneira de destacar a complexidade de como abordar as iniquidades e como fazer para que as pessoas tenham acesso aos serviços de saúde, como fazer uma divisão do poder econômico e dos recursos. Também foi muito importante poder ouvir a sociedade civil”, comentou. Para a Zohra, outras temáticas ainda precisam ser debatidas. “O trabalho começou e as pessoas já têm um caminho de quais são as recomendações que vão ser implementadas no Nordeste. A 1ª CRDSS também nos permite ver como ajustar as outras conferências que vão acontecer no Norte, Sul, Sudeste e Centro-Oeste. O Brasil está abrindo um caminho. Como país que sediou a Conferência Mundial de DSS, estão todos olhando como o Brasil vai aplicar as recomendações. Ainda temos muito trabalho e me sinto privilegiada em acompanhar este processo”, avaliou.

Vanessa destacou a profundidade das discussões
Vanessa Lima destacou a profundidade das discussões

Para a coordenadora local da conferência e pesquisadora da Fiocruz Pernambuco, Eduarda Cesse, o evento superou as expectativas. “Tivemos uma participação muito balanceada entre gestores, sociedade civil e especialistas, que era uma necessidade e uma intenção desde sempre. Superou expectativas porque o número de pré-inscritos correspondeu ao número de inscritos; porque os debates e as sessões temáticas geraram relatórios que puderam consolidar e sintetizar as principais discussões e contribuições e, com isso, subsidiar o relatório final da conferência, e até um bom balizamento para as próximas conferências regionais. E superou nossas expectativas porque houve também uma participação muito efetiva de todos os palestrantes que contatamos”, declarou. Eduarda comemorou a nível da qualificação das discussões e a presença das instituições. “O número de participantes de outros estados foi importante e não só das capitais, mas dos municípios do interior também. Não esperávamos que Pernambuco tivesse uma participação menor, por motivos óbvios mas, não só participantes do Recife. Acredito que o balanço final é muito positivo”, comemorou.

Entre os participantes o clima também foi de reconhecimento e entusiasmo. A professora do curso de psicologia da UFPE, Vanessa Lima, destaca a profundidade dos debates e discussões. “Foi evento muito rico, porque uniu atores importantes da região Nordeste. A área de determinantes está entrando nas pautas recentemente e acho que precisa de um aprofundamento na base, para compreender o que são os DSS e, a partir daí, pensar estratégias possíveis de intervenção e ação. Nesse sentido acho que foi muito importante, porque trouxe várias pessoas de grande relevância. Também trouxe representantes dos movimentos sociais, que tinham acúmulo e conhecimento, alguma possibilidade de intervenção. Foi um debate acadêmico profundo, mas, diante do cenário atual, de primeiro conhecer os determinantes para depois propor ações eficazes, acho que foi bem positivo”, avalia.

Josemar
“Evento foi uma oportunidade de reflexão e aprimoramento dos conhecimentos” (Josemar Ramos)

A mesma opinião foi compartilhada pelo estudante de fisioterapia da UFPE, Josemar Ramos, que viu o evento como uma oportunidade de reflexão, esclarecimento e aprimoramento de conhecimentos. “Sempre tive a visão voltada ao lado público da saúde e a universidade, geralmente, não nos forma para atuarmos na área pública, não temos essa educação. Achei a conferência muito boa, porque traz um tema que não discutimos em sala de aula, mas que eu tenho discutido em outros eventos e oportunidades, em outros contextos. E é um tema muito rico e de extrema relevância. Os debates foram muito ricos. Não é em qualquer lugar que temos uma discussão sobre o impacto da Transposição do Rio São Francisco na Saúde. Deu para sair de cima do no muro, saber melhor sobre os pontos negativos e positivos e poder ter uma opinião mais específica. A conferência promoveu discussões que não existiam no âmbito que eu fazia parte”, declarou.

Para Maria Inês Barbosa, consultora nacional da Opas, é importante regionalizar as discussões sobre DSS como forma de compreender melhor e aprimorar os conhecimentos. “Foi importante regionalizar a discussão sobre os determinantes sociais, ancorada no contexto histórico das desigualdades que perpassam a formação social brasileira e te permite chegar mais próximo do que são estes determinantes e como eles se complexizam em quando se pensa o Brasil. Sempre que você trata das questões de forma universal você deixa escapar as singularidades. E num espaço como este permite ver a região no contexto brasileiro, como se dá essa geopolítica do poder, embora, também para dentro do território onde essas dinâmicas estão apresentadas. Avalio que é um espaço que possibilita que a gente avance no processo de desconstrução, superação dessas iniquidades, desses determinantes sociais. Importante demarcar que o Nordeste é uma região que em sua geopolítica racial, histórica, é majoritariamente negro e isso se evidencia, também em como o país vê essa situação. É onde começou a história do Brasil, além de ser um território onde índios, negros e ciganos, por exemplo, tem uma historicidade que precisa ser enxergada do ponto de vista de como ela impacta a saúde”, comentou.

Para Gerson Brandão, foi importante, como resultado da CRDSS, o entendimento do racismo como um determinante social
Para Gerson Brandão, foi importante, como resultado da CRDSS, o entendimento do racismo como um determinante social

Gerson Brandão, coordenador do Grupo de Trabalho de Juventude Negra do Conselho Nacional de Juventude destacou o entendimento da questão de raça dentro das discussões, sintonizando com o cenário do racismo como determinação social na saúde. “Acho que o importante enquanto resultado da CRDSS, principalmente na região Nordeste, é o entendimento do racismo como um determinante social e principalmente nós considerarmos esse fator mais evidente que é o crescimento das taxas de mortalidade da juventude negra – considerando que para a Organização Mundial da Saúde, a saúde é mais ampla do que o estado de não doença e o Brasil ratifica essa proposição. É importante termos apontado isso e esse apontamento sair como uma das possíveis diretrizes das novas ações do MS, das relações com estados e municípios, na construção de políticas públicas que dialoguem com esses determinantes sociais. Para mim, o pronto principal da conferência é esse reconhecimento da urgência do atendimento, da visibilidade do jovem e da jovem negra no espaço da saúde e nos outros espaços da política pública”.

Durante os três dias da 1ª Conferência Regional sobre DSS passaram pelo evento 337 inscritos de todos os estados do Nordeste, além de Amazonas, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Roraima e São Paulo. Além de 21 municípios pernambucanos, marcaram presença também participantes de duas cidades de Alagoas, cinco do Ceará, duas do Maranhão e duas do Piauí três de Sergipe.

Espera-se que a 1ª Conferência Regional sobre DSS do Nordeste tenha desdobramentos concretos, a partir das reflexões feitas durante os dias do evento. As expectativas giram em torno não apenas da realização de novas conferências para seguir regionalizando o debate sobre a determinação social na saúde, mas, que esta primeira conferência possa ter esclarecido os papéis e as contribuições de cada um dos atores na luta pela construção de uma sociedade com menos desigualdades. Espera-se que cada um dos participantes tenha saído da conferência com entusiasmo para levar à frente as metas e recomendações construídas coletivamente durante o encontro e que ele ajude a estreitar o diálogo entre a sociedade civil, produtores de conhecimento e poder executivo. Sobretudo, a expectativa é que a riqueza das discussões e dos debates que marcaram a 1ª CRDSS do NE possam influir positivamente na realidade da população do Nordeste e contribuir para a criação de uma nova realidade na saúde coletiva na região.

Leia aqui, na íntegra, a Carta do Recife.

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