Originada no movimento ambientalista mundial, as experiências de Agenda 21 têm seus méritos reconhecidos para além dos contornos setoriais, como impulsionadora de desenvolvimento local sustentado. Sua origem, no Brasil, está ligada a compromissos assumidos no ECO 92, de promover o desenvolvimento sustentado a partir de um trabalho intersetorial. (BUSS, 1997)
A partir de 2003, o Ministério do Meio Ambiente assumiu a agenda 21 como política pública, favorecendo a descentralização de recursos e a indução da participação social em suas estratégias de ação. Outras experiências, de governos passados, já haviam considerado a importância de ações que incentivavam a participação social e o empoderamento da população para o desenvolvimento local: programa DLIS (Programa de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentado). A agenda Cidades Saudáveis, estimulada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é uma das estratégias do movimento de Promoção da Saúde, conceitual e praticamente convergente em termos de metodologia e objetivos com as agendas citadas de desenvolvimento local. Essas iniciativas objetivam a melhoria da qualidade de vida, da qualidade ambiental e das condições de saúde da população.
Os entendimentos sobre determinação social da saúde e equidade, embora estejam no centro da agenda da OMS no momento, continuam, com seus defensores, vivendo a tensão paradigmática de sempre, passando pela dificuldade de assumir a importância que têm na hierarquização dos fatores que influenciam a saúde (Ayres, 2002, Breilh, 2006). Por essa razão, realizou-se pesquisa que teve como objetivo verificar os efeitos sobre a saúde da população produzidos por programas de ação – as agendas sociais – que não envolvem exclusivamente o setor saúde.
Um dos pontos principais do referencial teórico que orientou o trabalho foi a produção social da saúde: processo social de construção de condições de vida, com objetivos intersetoriais que correspondem às condições de fato, viabilizadas pelas relações entre forças sociais que se concretizam no cotidiano e compõem a vida em sociedade. Este referencial permite indagar, também, como ações que não envolvam diretamente o sistema, serviços e ações de saúde, podem produzir mudanças na situação de saúde das populações.
As agendas sociais, espaços de construção coletiva, intersetoriais e promotoras do desenvolvimento participativo das populações no processo de tomada de decisões, se aproximam do campo da saúde e mais especificamente da área da promoção da saúde. Amparam-se em princípios holísticos, de equidade social e de governança participativa. Apóiam-se em ações multi-estratégicas, favorecedoras do empowerment e intersetoriais.
A investigação realizada sobre os processos locais de implantação das agendas sociais procurou relacionar o processo de implantação das mesmas com potenciais efeitos sobre os determinantes sociais de saúde, especialmente os que implicam na transformação da relação entre as pessoas e o sistema.
A pesquisa foi feita em três etapas: levantamento de agendas sociais em funcionamento nas cinco grandes regiões geográficas do país; estudo estatístico que procurou relacionar mediante construção de clusters, municípios que apresentaram, a partir de dados secundários de série histórica de três anos, progressos relacionados aos ODM; estudo de caso de 24 experiências municipais de desenvolvimento de agendas sociais.
Como resultado da primeira etapa da pesquisa, foi elaborado cadastro das iniciativas de agendas sociais em funcionamento. Cento e cinco municípios foram selecionados dentre o universo de municípios brasileiros coberto pela bibliografia especializada sobre desenvolvimento local, agendas ambientais e municípios saudáveis, que preencheram os requisitos estipulados: agenda ativa ainda no ano de 2007, iniciada há no máximo dez anos, com comprovada documentação escrita sobre a experiência e com contato formal comprovado por meio telefônico ou meio eletrônico.
A figura 1 apresenta a intensidade de concentração dos municípios-caso selecionados para este estudo. A localização geográfica dos municípios com agenda e a concentração nas regiões sul e sudeste do país, notadamente os estados de Paraná e São Paulo e em menor intensidade no Rio de Janeiro, traz para análise o conceito de equidade como determinante social da saúde e da qualidade de vida. Estes parecem não estão colocados como fatores protetores das mesmas condições nas regiões do país que “tem menos”. As áreas onde se concentram as agendas sociais, região sul e sudeste são regiões do Brasil mais desenvolvidas, onde não seria tão necessário que se concentrassem esforços e recursos do governo “fatores protetores” da saúde e qualidade de vida. A região nordeste e principalmente as regiões norte e centro oeste tem muito poucas agendas em desenvolvimento; contraditoriamente são as regiões do país onde a desigualdade social, os recursos para a vida e qualidade de vida são mais escassos. Embora seja facultado a todos os municípios apresentarem propostas de projetos para desenvolverem essas agendas sociais, os que devem ter mais oportunidades de capacitar profissionais para a elaboração de projetos, os da região sul e sudeste, serão os que terão mais poder de competitividade se concorrer por verbas. Este resultado da fase I do projeto demonstra o que a literatura já reitera: o círculo da pobreza se reproduz, mesmo quando há uma intenção do poder público de enfrentá-la.
Figura 1 Mapa apresenta a intensidade de concentração dos municípios-caso
Referências Bibliográficas
Ayres JRCM. Epidemiologia, promoção da saúde e o paradoxo do risco. Rev Bras Epidemiol. 2002 Supl 1;5:28-42.
Breilh J. Epidemiologia Crítica: Ciência Emancipadora e Interculturalidade. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2006.
Buss PM. A promoção da saúde no desenvolvimento sustentável. In: I Seminário Institucional de Promoção de Saúde-SESC/RJ; 1997 Dez 2-5; Rio de Janeiro.
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