O que fez melhorar o déficit de estatura em crianças na região Nordeste?

Indicador do Observatório sobre este tema:
Ind010308

Uma das principais alterações do perfil nutricional de crianças nos países em desenvolvimento é a desnutrição e o consequente déficit de crescimento. O Brasil, apesar de avanços consideráveis nessa área, ainda discute e procura soluções para reduzir as desigualdades associadas a essa condição, que permanece como um problema de saúde pública. O modelo de determinantes da desnutrição infantil é multicausal e inclui aspectos biológicos e sociais, associados à escolaridade materna, assistência à saúde, saneamento básico (ampliação de redes de abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo), condições de moradia e renda familiar, que juntos constituem uma estrutura hierárquica, dinâmica e heterogênea.

Segundo Ministério da Saúde, a estatura para idade indica o crescimento linear da criança, e representa um resumo da situação pregressa, desde o nascimento até a mensuração. Crianças com déficit de altura atual correspondem a crianças que apresentaram déficit de peso anteriormente e cuja situação de desnutrição pode ser considerada crônica. Além disso, a altura não pode ser recuperada em momentos posteriores, de modo que esse déficit é levado para toda a vida.

Nas últimas décadas, as transformações econômicas, sociais e demográficas modificaram consideravelmente o perfil nutricional da população infantil. No Brasil, a redução expressiva da desnutrição infantil refletiu em uma queda de três vezes no déficit de peso para idade e de duas vezes no déficit de altura para idade em crianças menores de cinco anos, somente no período de 1996 a 2006, conforme explica Patrícia Jaime em entrevista ao nosso Observatório.

A taxa de prevalência de déficit estatural em crianças de 5 a 9 anos, por ano, segundo região e sexo, é descrita pelo indicador 010308 do nosso Observatório, baseado em dados do Estudo Nacional de Despesa Familiar (ENDEF) de 1974-1975, do Ministério da Saúde: Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989, e do IBGE: Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2008-2009, que confirmam uma redução do déficit estatural em todo Brasil*. Em meninos, a prevalência que era de 29,3% em 1974-75, passou a ser de 7,2% em 2008-2009. Redução semelhante também foi observada entre as meninas, cuja prevalência de déficit estatural declinou de 26,7% para 6,3% no mesmo período.

Grande parte da redução do déficit estatural no Brasil foi devida à diminuição da prevalência expressiva ocorrida na região Nordeste. Entre 1989 e 2008-2009 a prevalência de déficit estatural em meninos de 5 a 9 anos nessa região reduziu de 24,5% para 7,9%. Essa prevalência havia sido de 44,4% em 1974-75, o dobro da prevalência da região Sudeste para o mesmo período, realçando as enormes desigualdades regionais e econômicas existentes no final da década de 80. As meninas seguiram a mesma tendência.

O declínio da desnutrição infantil no período 1975-1989 foi atribuído essencialmente a progressos moderados na melhoria da renda familiar e à expansão da cobertura de serviços públicos de educação, saneamento e saúde, segundo relatam pesquisadores da Universidade de São Paulo. Além disso, esse declínio foi fortemente influenciado pela Constituição Federal de 1988, que, entre outras conquistas, reforçou os direitos sociais básicos e trouxe as bases para a criação do Sistema Único de Saúde. De 1989 a 2008-2009, a redução da desnutrição e consequente déficit estatural seria reflexo não só da melhoria da escolaridade materna e do aumento do poder aquisitivo familiar, mas da assistência à saúde, em especial com a Estratégia Saúde da Família, e das melhores condições de saneamento básico.

Outras análises mostram resultados semelhantes em uma capital do Nordeste. A prevalência da desnutrição infantil a partir do índice de estatura para idade diminuiu 65% no Estado de Pernambuco entre 1991 e 2006, segundo pesquisadores da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Alagoas e colaboradores da Universidade Federal de Pernambuco. No entanto, é evidente a persistência das iniquidades sociais relacionadas à desnutrição infantil,e os resultados devem ser avaliados com cautela. Em Pernambuco, renda e escolaridade materna foram determinantes do déficit estatural de crianças. Além disso, atualmente, no Brasil, os maiores percentuais e as formas mais graves de Insegurança Alimentar e Nutricional, estão nos domicílios em que residem os menores de 18 anos dos municípios das regiões Norte e Nordeste, detentores das maiores prevalências de déficit estatural. No interior rural de Pernambuco, por exemplo, ainda se concentram as maiores prevalências desse agravo, provavelmente porque lá estão as piores condições de acesso à saúde em comparação aos grandes centros urbanos.

Para conservar esses resultados positivos e melhorá-los ainda mais, é essencial manter e intensificar as ações que favoreçam o aumento do poder aquisitivo dos mais pobres, além de assegurar investimentos públicos que permitam completar a universalização do acesso da população brasileira aos serviços essenciais de educação, saúde e saneamento básico. Ações no campo da promoção da saúde e investimentos na área social, melhoria na educação e geração de renda são o caminho para a prevenção e o combate a esse e outros agravos nutricionais, especialmente no Norte e Nordeste do País. Sendo assim possível garantir a equidade entre as famílias de diferentes regiões e áreas (urbanas e rurais) do Brasil.

*Apesar dos inquéritos realizados no Brasil desde 1975 não serem imediatamente comparáveis em função das diferentes estratégias analíticas empregadas e da desigual disponibilidade de dados nos períodos correspondentes, nos dados apresentados pelo nosso Observatório as distribuições de referência e os critérios utilizados na definição dos indicadores foram os mesmos utilizados na POF 2008-2009, e todas as estimativas calculadas foram padronizadas para a distribuição etária da população na POF 2008-2009, empregando-se sempre o método da padronização direta.

Referências Bibliográficas

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